ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | As motivações, as máscaras e o desnudamento da verdade em Anatomia de um crime, de Otto Preminger |
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Autor | Odair José Moreira da Silva |
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Resumo Expandido | Os filmes de tribunal sempre colocam a verdade em questionamento. Por mais óbvio que possa parecer, esse questionamento, quando surge como premissa na diegese de um filme, sempre traz uma conseqüência, seja ela positiva ou negativa: alguém acusado de ter cometido um crime é condenado ou absolvido. E, como resultado, fica uma pergunta no ar: será que o acusado é realmente culpado ou apenas mais uma vítima, um bode expiatório que está acobertando, na realidade, uma verdade que ainda não foi revelada?
Muitos filmes que abordam os tribunais conseguem deixar bem claro um lado eficaz desse posicionamento em relação à verdade: o culpado é realmente culpado ou o culpado é realmente inocente. Mas há aqueles filmes que deixam uma dúvida no ar e conseguem plantar uma semente que resultará em um desvio daquilo que era antes esperado como verdade, criando, dessa maneira, uma expectativa falsa em relação a tudo que havia sido questionado anteriormente. Assim, como a surpresa das pessoas envolvidas no julgamento, o espectador também verá suas apostas naquilo que era considerado verdade serem anuladas. As máscaras caem, as motivações aparecem e a verdade realmente é desnudada. Anatomia de um crime, dirigido em 1959 por Otto Preminger, é um bom exemplo desse grupo de filmes que trazem as máscaras como um motivo narrativo muito bem construído e causador de certos questionamentos sobre o que é a verdade. Uma motivação maior, crescente, que percorre esse filme é a busca pela verdade. O objetivo maior de Paul Biegler – o advogado protagonista interpretado por James Stewart – é o encontro com a verdade, ou aquilo que ele supostamente aceita como verdadeiro: provar a inocência do tenente Manny, mostrando que ele agiu inconscientemente quando atirou em Barney Quill (após a conclusão de que Quill havia violentado sua esposa, Susan) Essa exposição temática revela uma espécie de comprometimento para saber quem é quem num emaranhado de depoimentos suspeitos. Há uma preocupação latente em revelar as pessoas por detrás de suas máscaras: “aprendi que as pessoas não são boas ou más. As pessoas são muitas coisas”, como diria Paul. Como exemplo desse baile de máscaras, basta pontuar, pelo menos, quatro personagens que tomam a centralidade da narrativa e impulsionam o seu andamento temático: Paul Biegler, Laura Manion, Frederick Manion e Barney Quill. Preminger constrói as características de suas personagens de maneira que todas possuem, de certa maneira, um traço de ambigüidade. No entanto, as máscaras são desfeitas. Alguns questionamentos pertinentes ao sentido denotativo do filme serão postulados neste trabalho. Seguindo diretrizes teóricas embasadas em B. Tomachevski, formalista russo, e em David Bordwell, notadamente suas pesquisas sobre o cinema clássico hollywoodiano, o que se pretende aqui é justificar a premissa de que Anatomia de um crime é um filme clássico por apresentar um grande número de motivações que estruturam sua narrativa, que caminha por uma linearidade sem interrupções e aponta para as possibilidades criadoras daquilo que se pode chamar de motivação estética (termo emprestado de B. Tomachevski), em que as dualidades aparecem não só na interpretação do sentido do filme, mas também na construção de sua forma (entendido aqui como os recursos expressivos que criam as imagens descritivas do filme). Outro detalhe a ser frisado gira em torno da composição das personagens e de suas máscaras. Percebe-se que no cinema clássico, como bem aponta Bordwell, as cenas concluem ou prosseguem os desenvolvimentos de causa e efeito deixados pendentes em cenas anteriores, em que há uma abertura, ao mesmo tempo, para novas linhas causais e para um desenvolvimento futuro. Também será questionado aqui se o filme cumpre com esse papel, assim como será verificada a premissa de que ele é clássico por se ater a detalhes estruturais que corroboram sua direção narrativa, embora a “justiça poética” não tenha ficado tão exposta na resolução da diegese. |
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Bibliografia | BORDWELL, David. O cinema clássico hollywoodiano: normas e princípios narrativos. In: RAMOS, Fernão Pessoa (org.). Teoria contemporânea do cinema. Documentário e narratividade ficcional. São Paulo: Senac, 2004, tomo II, pp. 277-301.
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