ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | Memórias do Subdesenvolvimento: estratégias estéticas para uma política da voz no cinema |
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Autor | ELEN DOPPENSCHMITT |
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Resumo Expandido | Das relações entre a tradição do escritor como "encarnação da consciência social" e a crise do ponto de vista no cinema novo latinoamericano, investiga-se o caráter revolucionário presente na estética de Memórias..., analisando as manifestações de uma política para a voz. Sendo assim, compreende-se a obra de Alea mediante diferentes chaves de leitura: 1) a alegórica, conforme Xavier (2004), onde o filme – revolucionário em sua técnica (Benjamin, 1987) – alarga a nossa compreensão a respeito dos procedimentos estéticos subjacentes a uma idéia de nação latinoamericana e 2) a comunicacional, que amplia o campo de interpretação cinematográfica ao incluir também as teorias do próprio cineasta (Aumont, 2004) e ressaltando as mediações comunicativas na relação entre autor, obra e espectador (Barbero, 2005). Das estratégias estéticas observadas no filme (inserção do documentário na ficção, uso de câmeras leves, collages, voz over etc) enfatizamos aquelas relacionadas à voz, pois revelam distintos níveis de preocupação formal. Seja pela combinação de diferentes funções da linguagem (poética, emotiva, referencial), seja pelo uso diferenciado da enunciação (manipulação do foco-narrativo) ou ainda pela presença de elementos de distintos universos de oralidade, a combinação das imagens e das performances da voz possibilita discutir, a partir de um outro viés, os aspectos ideológicos contidos no filme.
Considera-se o filme um instigante campo para a compreensão de um universo mítico/poético e sua contraparte paródica, em que a marca das culturas latino-americanas é inegável. Nele é possível identificar intertextualidades e diversos processos de tradução intersemiótica, especialmente no trabalho voz/imagem, o qual cria espaço para novas abordagens para se pensar a cultura latino-americana no cinema a partir do entrelaçamento entre personagens históricos e literários, paisagens imagéticas ou sonoras e na diversidade de símbolos nacionais que muitas vezes aparecem resignificados em diferentes meios (rádio, televisão, publicidade etc). Há neste filme sutilezas estéticas que protegeram a voz de uma possível estagnação (a de ficar subordinada à imagem) e que, por sua vez, apontaram um novo horizonte para o qual se expandir, ou seja, para um horizonte político. É impossível separar o estético e o político em Alea, pois este último, longe de ser um elemento de propaganda (não só reflete o comprometimento de seu cinema com a Revolução), informa como Alea “dirigiu a câmera para os mesmos problemas em que se sentia submergido ─ implicitamente em Memórias..., explicitamente em Hasta Cierto Punto ─, onde os protagonistas são também cineastas”(Chanan, 2001:64), ou seja, em sua maneira especial de trazer o distanciamento que é a chave tanto da estética quanto da política do diretor:“Em outras palavras, sua estética inclinava-se para o humor, a razão e a objetividade, enquanto que sua política era a de um espírito comprometido ainda que independente”(Chanan, 2001:64). Nessa relação entre o estético e o político, cabe a voz um lugar especial, pois a maneira como Alea a imprime em seus filmes colabora para o exame do traço oral que, se bem não define, salienta especificidades do cinema político latino-americano. Em Memórias..., o diretor nos revela permanências do gênero oral no meio audiovisual, apontando para relações de proximidade entre as culturas populares e eruditas, assim como entre a tradição e as vanguardas artísticas. A presença de universos orais em abundância e diferenciação são elementos significativos neste filme, o que leva a crer que a manipulação e a disposição das vozes caminharam juntas para a construção de uma imagem crítica. Vozes off, vozes over, vozes gravadas, vozes objetivas e subjetivas, vozes da memória, vozes poéticas ou discursivas, vozes da televisão ou do rádio estão presentes mediante intensa mobilidade quanto as formas de se registrar o oral, promovendo ambigüidades – mas não por isso falta de clareza – na narrativa. |
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Bibliografia | ALEA, Tomás Gutiérrez. Dialética do Espectador. São Paulo: Summus, 1984.
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