ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | A sombra que me move, também me ilumina – sobre alguns curtas da Casa de cinema de Porto Alegre |
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Autor | Luiz Antonio Mousinho |
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Resumo Expandido | Abordaremos aspectos dos curtas-metragens Dona Cristina perdeu a memória e Três minutos, dirigidos por Ana Luíza Azevedo, com roteiro de Jorge Furtado, além de Esta não é sua vida, Ilha das Flores e Sanduíche, de Jorge Furtado. Entre outros aspectos, observaremos a discussão de Walter Benjamin sobre o narrador tradicional, o narrador da ficção e o narrador da informação jornalística (1980). Levaremos em conta também a retomada contemporânea da discussão de Benjamin pela tradição brasileira, a partir de Silviano Santiago (1989), vendo como o autor atualiza a grade de Benjamin ao tratar o narrador pós-moderno. Ao investigarmos o rendimento de tais categorias na abordagem dos curtas, estaremos também mobilizando a categoria narrador no sentido de modo narrativo, pela via da narratologia (GENETTE, s/d). As categorias do estranho e do familiar (FREUD, 1976), também serão estudadas tematicamente e enquanto constituintes estéticos dos audiovisuais, numa abordagem que também prevê atenção para a construção dos personagens (SALLES GOMES; CANDIDO, 1976), sejam eles ficcionais ou não.
Em Esta não é sua vida, o solo familiar de uma vida convencional é desestabilizado pela percepção construída audiovisualmente de que ninguém é comum, se a pessoa tem a chance de contar a história de sua vida. Na narração da própria experiência, mediada pelo discurso cinematográfico e de um narrador que a comenta, percebe-se o aflorar das várias possibilidades de uma vida domesticada, resumida a uma escolha que exclui outras. A fragmentação do discurso informativo, a recuperação da narrativa tradicional através do ouvir-se o narrar a própria experiência e a montagem desse material na construção fílmica serão observadas no processo interpretativo. Em Três minutos, de Ana Luíza Azevedo, o ambiente familiar desenhado no espaço narrativo se transmuta em estranho, na urgência temporal indiciadora da prisão doméstica e do retorno da personagem de sua ensaiada fuga do lar. Sanduíche carrega o estranho inscrito no familiar (FREUD, 1976) no narrar o motivo trivial e imediato da separação de um casal (“quando a vi com uma calça de couro”) e na instabilidade da acumulação de histórias que vão se mostrando encenação dentro de encenação, num procedimento metalingüístico que também aposta na comunicabilidade (e não apenas no desconforto), trazendo em si características pós-modernas, nos termos nos quais Renato Pucci vem trabalhando a questão (2008). Ao mesmo tempo, parece se delinear aqui a narrativa em sua amplitude de oscilação e como grão germinador de significações conforme Walter Benjamin em O narrador, além da sugestão, socialmente e esteticamente colocada, de superar o gesto de alienar o poder perpétuo de dar-se mundos em proveito de um deles, para falar com Merleau-Ponty (1971). “A vida social consiste em destruir aquilo que lhe dá o seu aroma”, dirá Lévi-Strauss em Tristes trópicos. Ilha das flores traz um narrador que repisa a lógica social, numa acumulação de assertivas saturadas na montagem cinematográfica e que vão desentranhando o elemento social recalcado. Isso em procedimentos que ressaltam o aspecto redutor dos conceitos, no plano temático, delineando em termos estéticos essa visão trazida para a linguagem, fazendo o que Nietzsche proporia em termos de desmantelar os limites do solo certo e seco dos conceitos (NIETZSCHE, 1987). A ressignificação da experiência em suas possibilidades ternas e libertárias se dá no encontro proporcionado em Dona Cristina perdeu a memória. Experiência, memória, construções de sentido que se desenham no filme em termos de cerca, círculos, objetos e diálogos na passagem ritual da experiência. Ali a experiência do mais velho da qual fala Benjamin ganha corpo na narração, mas é colocada por um narrador pós-moderno, narrador este que, na releitura de Santiago, se constituiria por representar um olhar lançado ao outro. Trazendo, poderíamos pensar, a sombra da tradição como limite e como mapa de possibilidades. |
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Bibliografia | BENJAMIN, Walter et.al. “O narrador”. In: ___ . Textos escolhidos/ Benjamin, Horkheimer, Adorno, Habermas. São Paulo: Abril, 1980.
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