ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | Modernidade e nostalgia no cinema chinês contemporâneo |
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Autor | Ludmila Moreira Macedo de Carvalho |
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Resumo Expandido | Segundo Gilles Deleuze, o cinema só se torna moderno quando se vê obrigado a produzir um novo tipo de imagem capaz de responder à crise trazida por configurações históricas inéditas. Ele estava se referindo, primeiramente, aos movimentos cinematográficos surgidos após a Segunda Guerra Mundial – o neo-realismo na Itália e a nouvelle vague na França – e que foram responsáveis pela transição da imagem-movimento do cinema clássico para a imagem-tempo do cinema moderno. Se pudermos extrapolar a estrutura do pensamento deleuziano para além da Europa e em direção à Ásia, é possível entender o intenso processo de modernização pelo qual passa a China a partir dos anos 80 como um destes momentos de crise, e o cinema ali produzido desde então como a criação de um novo tipo de imagem capaz de responder a este cenário.
Minha proposta é a de questionar de que maneira o processo de modernização vem sendo retratado cinematograficamente nas três regiões que configuram os cinemas de língua chinesa (Taiwan, Hong Kong e China continental), levando em consideração suas diferenças sociais e estéticas. Nostalgia parece ser o denominador comum quando tomamos, a titulo de amostra, três filmes recentes de diretores proeminentes em cada uma das regiões: “What Time is it There” de Tsai Ming Liang (Taiwan, 2001), “2046” de Wong Kar-wai (Hong Kong, 2004) e “Still Life” de Jia Zhang-ke (China, 2006). De todos eles desprende-se uma sensação nostálgica, embora cada um represente uma faceta diferente do conceito. “2046” parece, à primeira vista, representar o conceito clássico de nostalgia como lembrança sentimental de algo que passou, uma vez que o filme se passa nos anos 60 e encerra a trilogia composta também por “Days of Being Wild” e “Amor à Flor da Pele”. Neste filme, porém, a conhecida estética de Wong que eleva a fetiche objetos ordinários do passado contrasta com visões pseudo-fantásticas do futuro, num filme cujo título evoca, provocativamente, o primeiro ano após o cinquentenário de autonomia política da ex-colônia britânica depois de sua devolução ao domínio chinês em 1997. Em “What Time is it There” a nostalgia não é representada pelo passado, mas sim por uma contínua e inexplicável sensação de falta e incompletude, realçada pela completa ausência de comunicação e pela distância geográfica entre os personagens: um jovem que vende relógios em Taipei e a compradora de um destes relógios que vai para Paris e encontra-se alienada física e culturalmente. “Still Life” mostra, por sua vez, a nostalgia provocada por uma transformação social tão rápida que chega a ser palpável. Parte do filme se passa na região do rio Yangtze, onde a construção da maior represa do mundo vem provocando o alagamento de cidades inteiras e o deslocamento massivo de populações. É contra este pano de fundo de desconstrução e desolamento que um homem e uma mulher procuram por seus respectivos esposos desaparecidos. Os três filmes apresentam imagens que respondem, cada um à sua maneira particular, a um período de crise na história dos países de língua chinesa, mesmo que não tratem diretamente de assuntos sociais ou políticos. Embora estas imagens rarefeitas pareçam contrastar com a rapidez do processo de modernização, pode-se argumentar que, ao contrário, é apenas através deste tipo de imagem que se torna possível compreender as profundas transformações que elas representam. Trata-se de um espaço cuja transformação é tão rápida e traumática que a única maneira de captura-lo em imagens é evocando elementos como o vazio, a solidão e o desaparecimento. |
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Bibliografia | ABBAS, M. A. Hong Kong: Culture and the Politics of Disappearance. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1997.
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