ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | Shakespeare e o cinema brasileiro: gênero e contexto na mediação entre texto-fonte e filme adaptado |
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Autor | Marcel Vieira Barreto Silva |
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Resumo Expandido | O teatro de William Shakespeare (1564-1616) é uma das principais e mais recorrentes fontes de adaptação para o cinema. A partir de 1899, com a montagem que Sir Herbert Beerbohm Tree fez de King John para o teatro, que era alternada com projeções cinematográficas da própria peça, a dramaturgia shakespeariana ocupou a atenção de inúmeros diretores, em locais os mais diversos e com propostas estéticas particulares. Hoje, podemos identificar adaptações de Shakespeare em cinematografias tão diferentes como as de Gana (Hamile: 1964, dir. Terry Bishop), Índia (Omkara: 2006, dir. Vishal Bharadwaj), Egito (Shuhaddaa El Gharam: 1942, dir. Kamal Selim), Rússia (Dvenadtsataya noch: 1955, dir. Yanov Fried), Israel (Ahava Asura: 1990, dir. Jack Fisher) e China (Ye Yan: 2006, dir. Xiaogang Feng). A multiplicidade de culturas, estilos e períodos da história do cinema que se apropriaram de Shakespeare para contar suas histórias é bastante vasta, atravessando de forma incisiva, inclusive, países não anglófonos em que o texto shakespeariano já é, de cara, uma tradução.
A despeito da quantidade de adaptações em outras línguas e culturas, o estudo de Shakespeare no cinema foi (e, em larga escala, ainda é) centrado nos filmes falados em inglês. Nesse sentido, os paradigmas teóricos elaborados para refletir sobre as adaptações anglófonas (por serem dominantes na fundação do campo), costumam ser assumidos para dar conta dos filmes shakespearianos em outras línguas e culturas. Isso ocasiona incompatibilidades teóricas marcadas pela dificuldade de, por exemplo, analisar filmes brasileiros utilizando ferramentas criadas para pensar obras faladas em inglês e inseridas em outros contextos de produção. É o caso de Jack Jorgens, que em seu livro seminal Shakespeare on film (1977), propõe três modos de caracterizar as adaptações de Shakespeare: o modo teatral, que utiliza o filme como um meio de transcrever a performance do texto no suporte cinematográfico (é o caso de Henry V, de Laurence Olivier); o modo realista, que busca inserir o texto no ambiente visual e no espaço geográfico em que se passa (encenando, por exemplo, as batalhas de Macbeth em campo aberto, com inúmeros figurantes e combates sangrentos, como no filme de Roman Polanski); e, por fim, o modo fílmico, que consiste em atualizar a poesia e as imagens shakespearianas através da linguagem cinematográfica, de forma a criar similitudes e paralelismos entre texto e filme (as adaptações de Orson Welles são os exemplos mais sintomáticos). Embora essas categorias tenham se tornado paradigmáticas no estudo de Shakespeare no cinema, é necessário uma reavaliação teórica para pensar como os filmes de culturas e contextos não anglófonos se apropriam do texto shakespeariano. No trabalho ora proposto, pretendemos refletir sobre três filmes brasileiros realizados no início dos anos 1970, e diretamente relacionados com o texto shakespeariano: Faustão (1970, dir. Eduardo Coutinho), A Herança (1971, dir. Ozualdo Candeias) e O jogo da vida e da morte (1971, dir. Mário Kuperman). Nosso intuito é mostrar como, no caso brasileiro, a mediação entre texto-fonte e filme adaptado é articulada pelo gênero com que o filme dialoga e o contexto em que se insere. Nesse sentido, as mudanças narrativas e imagéticas realizadas nessas adaptações não se justificam unicamente por criar similitudes entre a linguagem do cinema e a peça adaptada (como no modo fílmico proposto por Jorgens), mas pelas conformações genéricas implicadas na resignificação do texto shakespeariano para os contextos brasileiros a que os filmes se referem. Com isso, pretendemos mostrar que a análise das adaptações de Shakespeare no cinema brasileiro deve pender o olhar para os contextos de produção e para as especificidades genéricas do próprio cinema nacional, de forma a perceber as tensões de significado entre o texto shakespeariano, como ponto de partida, e a materialidade textual/contextual dos filmes, como ponto de chegada. |
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Bibliografia | DAVIES, Anthony e WELLS, Stanley. Shakespeare and the Moving Image: the plays on film and television. Cambridge: Cambridge University Press, 1994.
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