ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | Inter-relações entre Cinema e Teatro - Deus e O Diabo na Terra do Sol e Terra em Transe |
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Autor | Denise Camillo Duarte |
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Resumo Expandido | Deus e O Diabo na Terra do Sol e Terra em Transe, de Glauber Rocha, são filmes onde cinema e teatro compartilham o mesmo espaço. Para implementar esse convívio, Glauber privilegia algumas técnicas basilares para sua mise en scène. A observação inicial é sobre a primazia do espaço. A escolha de cenários abertos e amplos que preferencialmente possam receber iluminação natural é fato. Em Terra em Transe a preferência recai por múltiplos espaços, principalmente palcos abertos como praias, terraços e varandas. Mesmo quando em espaços interiores, em geral, há portais ou portas abertas, sempre mantendo a sensação de amplitude e possibilitando a movimentação dos atores por esses vastos cenários. Verifica-se ausência quase que total de paredes, portas e janelas fechadas. As janelas são um importante elemento cênico, por onde entram as luzes exteriores que invadem a cena de modo direto ou, de modo indireto, através de cortinas ou venezianas, em um filme onde se aproveitou, sempre que possível, a luz natural. Escadas também são elementos cênicos cruciais, que permitem a livre exploração do espaço sem cortes.
Sejam externos ou internos, em tais espaços o trabalho do ator e o trabalho de câmera buscam um princípio comum: a continuidade. Através da unidade de espaço, mas não só dela, o diretor alcança o objetivo da continuidade da ação. Nessa urgência, fragmenta esse espaço, em alguns casos, em diferentes áreas de atuação que interliga por meio da marcação de atores ou da profundidade de campo, ou adota a técnica denominada neste estudo de confluência de áreas de atuação, numa intersecção de cenas dentro de cenas. Outra técnica observada é a de câmera, empenhada em melhor compor o conceito de continuidade. Tomando como exemplo Deus e O Diabo e seus longos planos-seqüências em espaços abertos, percebe-se de modo mais nítido do que na narrativa fragmentada de Terra em Transe que a câmera na mão intensifica, dependendo do caso, a exterioridade ou a interioridade da representação, a naturalidade ou o teatral da mise en scène. O uso da câmera dá-se sempre no sentido de complementar e potencializar a representação. Nos dois filmes, o lirismo do texto e a subjetividade dos personagens são captados em trabalho espetaculoso da câmera, que busca sempre a intensidade seja da luz, dos cenários, dos espaços. Em primeiro lugar do trabalho do ator. Em alguns momentos, adotou-se a câmera semidocumental, o que, esperava-se, deveria trazer à imagem um maior naturalismo. Ao contrário, porém, a força do ator e da mise en scène presentes nesses filmes fortaleceu sua teatralidade. O resultado na tela é uma explosão da representação, e não o oposto. Mesmo a adoção de não-atores, que convencionalmente insinua uma representação mais naturalista, não parece ter tal objetivo, posto que se encontra inserida em ambiente fortemente teatralizado. Antes, serve de contraponto para a mise en scène de um cinema do ator, seja no âmago da mesma cena ou seqüência, seja na montagem. É através do estilo de montagem que se estabelece a alternância em picos dramáticos, teatralizados, momentos esses de interiorizações ou instantes de exacerbação da representação, estruturando-se uma sucessão de imagens capazes de deter um forte significado de teatralidade. Conclui-se que o uso do espaço, o cuidado com a continuidade, o trabalho da câmera e a montagem expressam nada mais do que a ênfase primeira desse cinema: o ator. Deduz-se, então, que se por um lado esse cinema desconstrói as fronteiras entre cinema e teatro enquanto múltiplas possibilidades de troca entre as duas artes no seio de uma mesma obra, por outro o convívio entre elas neste mesmo espaço segmenta-as em termos de seus caracteres mais intrínsecos. Preservam-se, assim, as particularidades de cada uma dentro desse cinema do ator. Não há intenção de diluí-las de modo a constituir uma só expressão artística, mas sim de compartimentá-las e aplicá-las cada qual trazendo em si a contribuição que lhe é própria. |
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Bibliografia | DUARTE, Denise Camillo. Teatro e cinema: deus e o diabo na terra do sol e terra em transe, de Glauber Rocha. Dissertação de Mestrado. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), 2008. |