ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | Abril despedaçado: confluências entre cinema, literatura e pintura |
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Autor | Raquel do Monte Silva |
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Resumo Expandido | O filme Abril despedaçado (2001) traz si alguns elementos que traduzem a sua natureza intertextual e multicultural, pois dialoga simultaneamente, entre outros, com dois campos artísticos: a pintura e a literatura. No primeiro caso, percebe-se, por exemplo, como a composição fotográfica traz na sua essência elementos plásticos ligados a Rildebrant, pintor viajante do século XVII. Outro aspecto que discutiremos na apresentação é a relação da obra com o campo literário, tendo em vista que ela representa uma adaptação do romance albanês de Kadaré. Sendo assim, averiguaremos quais os códigos narrativos articulados por Walter Salles para compor a peça cinematográfica e quais elementos na obra apresentam o dialogismo entre as artes plásticas, o cinema e a literatura.
Do ponto de vista imagético, observamos elementos como exposição, foco e ângulo, por exemplo, dialogam com a pintura de Rildebrant e, sobretudo, como estes códigos visuais contribuem para uma construção de uma representação intra-textual. Entre as diversas concepções que interagem com a noção de fotografia no cinema, compreendemos aqui que este elemento tem uma função dramática. A luz funciona como um marcador que condensa um caráter narrativo e estruturante da trama: Si la lumière peut être dramatisée, c’est que elle s’y prête de par nature. L’art classique va jouer d’un drame proprement ontologique (au plein sens du mot : où l’être de la lumière, et donc du cinématographe, renvoie à l’être en général, humain en particulier). A savoir une dualité, un dechirement de l’être intime de la lumière entre clarté et obscurité, doublé d’une déperdition ou perte *(D’ALLONES, 1991, p. 99) Do ponto vista fílmico, o primeiro elemento do romance incorporado foi a cor: o vermelho. O frio, a aridez das montanhas e o sangue derramado (presentes no início do livro) foram sintetizados imageticamente pela seqüência da camisa pendurada no varal, flutuando ao sabor do vento, manchada de sangue. A carga simbólica da cena denota, entre outras coisas, a possibilidade de comunicação com o além estabelecida pela família-vítima. Como atesta o discurso dos personagens ao falar que o sangue amarelado na camisa é sinal de que a alma do morto não encontrou sossego e precisa ser vingada. O outro aspecto bastante determinante em Abril é a questão do vinculo com a literatura, ou seja, a obra fílmica reflete de maneira singular o texto de Kadaré utilizando os seus códigos narrativos, mas, sobretudo, transpondo-o para outro espaço. A ligação de Abril com a literatura se dá em vários níveis. Inicialmente, percebe-se que no plano textual, aquele que se refere ao roteiro, a construção narrativa pauta-se a maior parte na escritura albanesa. Já no nível estrutural narrativo, ligado aos elementos básicos – tempo, espaço, personagens e narrador, os componentes também coincidem em vários momentos. No entanto, é no campo da realização fílmica, que surgem caminhos diferentes, apontando, portanto para o trabalho de recriação. Neste processo, há um elemento que é articulado e que consideramos fundamental para a compreensão da obra: a transposição de paisagens. É justamente, no movimento de alterar os espaços geográficos que a nova obra é construída e, conseqüentemente, modificada a sua aura. De outro modo, o diálogo com a literatura colocado por Salles possibilita, também, uma leitura da obra vista a partir elementos visuais ligados à cultura local. Neste sentido, busca-se, a partir da análise narrativa, identificar como os elementos fílmicos articulados na diegese dialogam também com a produção cinematográfica brasileira contemporânea e, sobretudo, como eles atualizam o debate em torno da relação do cinema com outras artes. |
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Bibliografia | AUMONT, Jacques. O Olho interminável (cinema e pintura). São Paulo: Cosac Naify, 2004.
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