ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | Viva la tristeza! Os programas musicais de Pedro Almodóvar |
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Autor | Guilherme Maia de Jesus |
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Resumo Expandido | O estudo apresenta a síntese de um percurso analítico, realizado à luz do paradigma adotado pelo Laboratório de Análise Fílmica da Facom/UFBA, que investigou a música dos dezesseis longa-metragens de ficção dirigidos por Pedro Almodóvar, entre Pepi, Luci, Bom y otras chicas del Montón e Volver. Com raízes filosóficas em Aristóteles e Kant e estabelecendo diálogos com aspectos do pensamento de Luigi Pareyson, Paul Valéry e Umberto Eco, o método aqui empregado atualiza noções construídas com base no exame que Aristóteles faz das Tragédias e propõe uma abordagem do filme a partir dos efeitos cognitivos, sensoriais e sentimentais que a obra produz em um espectador-modelo. Para essa ‘Poética do Filme’, obras expressivas audiovisuais são programas: sistematizações de recursos com o propósito de prever e providenciar determinados tipos de efeitos na apreciação. No contexto da metodologia, portanto, programas podem ser entendidos como a materialização de estratégias dedicadas a buscar os efeitos que caracterizam uma obra. Neste sentido, cada filme é uma peculiar composição de programas e, como são os programas que dão a têmpera específica de uma determinada obra, é legítimo considerá-los o interesse primário da atividade analítica.
Boleros, dance music, rancheras, rocks, merengues, funks e mambos; Stravinsky, Pérez Prado, Shostakovich, Miles Davis, Tchaikovsky; canções espanholas, catalãs, mexicanas, italianas, argentinas, chilenas, cubanas, brasileiras, francesas e alemãs; zarzuelas, canções e músicas instrumentais flamengas; músicas orquestrais utilizadas anteriormente em outros filmes e música composta para o filme. O estudo sugere que é com essa matéria abundante que Pedro Almodóvar oferece à apreciação o jogo intertextual e as hipérboles sentimentais que caracterizam as trilhas sonoras do seu melodrama pop. Especialmente no que diz respeito à música instrumental, é percebido um percurso poético marcado por hesitações, mudanças importantes no domínio do modo de fazer, sucessos e fracassos declarados pelo próprio diretor. Ao mesmo tempo, é facilmente observável a fixação de um conjunto de estratégias poéticas instrumentais na segunda metade do eixo cronológico e emerge a percepção de um programa intertextual rico, bem-humorado e com teores elevados de coerência, engenhosidade e singularidade. Já as canções que o espectador de Almodóvar aprecia são dispositivos habilmente imbricados na própria estrutura do roteiro, fios do tecido narrativo que participam da composição do perfil dos personagens e imprimem uma marca de nacionalidade aos filmes. O que é mais singular nas canções de Almodóvar, todavia, são, em primeiro lugar, elas mesmas. A trilha sonora dos filmes do diretor de La Mancha é dominada por uma voz feminina que chora mágoas de amor em um tempo passado. São rancheiras, boleros, merengues, mambos e canções flamengas, que fizeram sucesso radiofônico entre os anos 1940 e 60, aproximadamente, interpretadas quase sempre por mulheres então consideradas grandes estrelas da canção de língua espanhola. Com harmonias triádicas bem simples, melodias sentimentais de fácil memorização e interpretação vocal de acentuada dramaticidade, as canções utilizadas por Almodóvar poderiam ser, do ponto de vista de um observador brasileiro contemporâneo, classificadas como pertencentes ao universo popularesco que costuma atrair os adjetivos brega ou cafona. É como se imaginássemos a obra de um diretor brasileiro de grande prestígio no momento atual que utilizasse na música de todos os seus filmes ao menos uma canção romântica de Ângela Maria, Dalva de Oliveira e Isaurinha Garcia, por exemplo. É curioso como esse esforço de imaginação, que constrói um objeto sem referente no mundo real do cinema, é capaz de revelar muito sobre a graça peculiar das escolhas musicais de Almodóvar. |
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Bibliografia | ALLINSON, Mark. A spanish labyrinth : the films of Pedro Almodóvar. Londres/Nova Iorque: I.B. Tauris, 2001.
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