ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | O elemento popular em documentários brasileiros dos anos 1920/1930 |
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Autor | Flávia Cesarino Costa |
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Resumo Expandido | O contraste entre o discurso de modernidade e a precariedade que se vê nas imagens de alguns filmes brasileiros da década de 1920 diz muito sobre uma certa tensão entre um Brasil rural e seus documentaristas de repertório urbano. Minha proposta é abordar algumas das maneiras pelas quais o chamado elemento popular (pobres, pretos, desvalidos, índios, excluídos) aparece em documentários dos anos 1920, nos quais as imagens desviam-se, voluntaria ou involuntariamente, da intenção do cineasta ou produtor de fazer do filme uma celebração ufanista do Brasil. Há nas revistas dos anos 1920 e 1930 todo um debate travado sobre qual Brasil deveria ser mostrado nas telas, qual seria a imagem desejável e o que precisava ser evitado.
Trabalharei as diferenças de abordagem de filmes naturais como Brasil Pitoresco – Viagens de Cornélio Pires (1925) e O Brasil Maravilhoso (1928-1930), os de curas milagrosas como As curas do Professor Mozart (1924) e A Santa de Coqueiros (1931) e do Major Reis como Viagem ao Roraimã (1927) e Parimã – Fronteiras do Brasil (1927) diante desse “popular que irrompe”, comparando-os entre si e relacionando-os com o que a crítica considerava desejável à época. A intenção é relacionar os elementos de estilo às diferentes visões de seus realizadores e financiadores, atentando para o que pode nos dizer aquilo que Eduardo Morettin chama de “exposição involuntária de nossos problemas sociais ou daquilo que se considerava atrasado, rural ou anti-higiênico” num contexto em que se tentava ressaltar os aspectos modernos do país. Considerar o popular ou o diferente como “pitoresco” tem antecedentes na tradição da exibição de relatos de viagem (travelogues) com imagens fotográficas estáticas de lanterna mágica, comuns no século 19. Os travelogues aparecem num momento em que novos gêneros de imagem e de narração assaltam o cotidiano com assuntos fascinantes e interessantes. Relatos de viagem e depois o cinema integrarão um repertório de máquinas de espetacularização do mundo, documentando como epopéia heróica e interessante o avanço colonial das potências, as mudanças urbanas, os momentos excitantes da modernidade. Também se consolida, não obstante, a demonstração, por estas mesmas imagens, da superioridade do colonizador sobre o colonizado, do urbano sobre o rural. Este discurso, nos filmes brasileiros, vai incorporar também, nas imagens, a questão do exótico e exuberante associados ao país. Nos filmes brasileiros, encomendados ou não, há uma explicita intenção de considerar pitoresco o que é “outro” em alguma medida, seja pelo atraso que esse outro revela, seja pelo contraste com o mundo do cineasta e do público a que se destina, seja pela pobreza dos tipos populares, seja pela precariedade do ambiente documentado. Minha idéia é trabalhar com a maneira pela qual os filmes exibem diferentemente seu entendimento desse outro. Por exemplo, na intenção de Cornélio Pires de indicar ao observador no que se deve prestar atenção, seja em seus gestos, às vezes irreverentes, seja nas imagens que mostra. No caso de As curas do Professor Mozart (1924), o subtexto é o de que àqueles pobres coitados que aparecem nas imagens faltaria uma certa força de vontade para enfrentar as adversidades, força esta que o Professor Mozart forneceria aos descapacitados por meio de seus “passes magnéticos”. chama a atenção o caráter espetacular das curas, feitas em frente à câmera e a muitos populares que assistem a tudo. Os “curados” muitas vezes caminham com muita dificuldade. Já no caso de Brasil Pitoresco – Viagens de Cornélio Pires (1925) o que temos é uma simpatia, uma valorização deslumbrada destas mesmas capacidades e inteligências populares, que Cornélio Pires tão bem conhecia. O que fica claro é que há uma intrigante diferença entre a visão dos diversos realizadores de filmes sobre o Brasil popular, ín |
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Bibliografia | GUNNING , Tom. “‘The Whole World within Reach’: Travel Images without Borders” in Roland Cosandey, François ALBERA (eds), Cinéma sans Frontières 1896-918 Images Across Borders, Aspects de l'internationalité dans le cinéma mondial: représentations, marchés, influences et reception / Internationality in World Cinema: Representations, Markets, Influences and Reception, Lausanne/ Québec, Payot/ Nuit Blanche, 1995.
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