ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | Auto-representação no cinema Africano: de Ousmane Sembene a Abderrahmane Sissako |
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Autor | Amaranta Cesar |
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Resumo Expandido | Até os anos 60, na África negra francófona, um decreto, outorgado em 1934 por Pierre Leval, então Ministro das Colônias, impunha uma autorização administrativa para filmar nesse território. Em termos práticos, tal decreto somava-se às dificuldades e interditos à auto-representação que condenavam os africanos ao retrato ideológico dos missionários, dos cineastas coloniais, dos etnólogos. O primeiro filme realizado por um cineasta africano, Afrique sur scène, de Paulin Soumanou Vieyra, Jacques Mélo Kane, Mamadou Sarr et Robert Caristan, só apareceu em 1957, mais de meio século depois da invenção dos irmãos Lumière. Realizado em Paris, na falta de uma autorização para filmar nos países de origem dos cineastas, o filme narra a rotina de estudantes africanos migrantes que tentam construir uma vida na capital francesa. No final, uma imagem “furtada”, que mostra crianças brincando em um rio do Senegal, aparece como a força do interdito e do que ele proíbe.
O primeiro filme de um cineasta africano filmado em terras africanas só surgirá, então, em 1962, depois da liberação das colônias francesas. Trata-se de Borrom Sarret, curta-metragem de Ousmane Sembene, conhecido como o pai do cinema africano pós-colonial. Foi Sembenne que denunciou de maneira mais enfática a imagem que se produziu dos africanos pelos cineastas-etnólogos ou pelos cineastas das expediçoões coloniais. Filmados por estes últimos - segundo ele, “como insetos” -, os africanos compuseram a alteridade do ocidente, conformaram o cenário dos resíduos de uma temporalidade e de um modo de vida em vias de extinção, o contra-campo, enfim, da modernidade, de uma história que avançava “apesar deles”. O cinema africano nasce, desse modo, marcado pela necessidade de construção e de afirmação de um olhar próprio, da reconquista e da descolonização das imagens e representações da África. Por isso, é possível dizer que o cinema africano é desde sua origem um cinema político. E até hoje essa cinematografia é atravessada por gestos políticos, uma vez que ela continua fortemente marcada pelo desejo e necessidade de conformação de um olhar “outro” e de uma outra imagem de “si mesmos”. Assim, a questão da auto-representação, que no contexto brasileiro tem assumido contornos importantes com a ampliação da propriedade dos meios de produção, atravessa toda a história dos cinquenta anos de cinema africano. Recentemente, em um artigo intitulado “A auto-representação no cinema africano”, Manthia Diawara argumenta em favor de um cinema africano que, ignorando as expectativas do “Norte”, possa se endereçar efetivamente ao público africano, o que não significa mais nem resgatar uma “identidade cultural”, nem negar a referência de Hollywood. Ele opõe, desse modo, Ousmane Sembene à nova e abundante produção da Nigéria (conhecida como Noolywood), tomando partido desta última, uma vez que ela constituiria uma comunicação efetiva com o público africano. Bamako (2006), filme de Abderrahmane Sissako, cineasta mauritâneo-maliense radicado na França, oferece uma resposta para além da oposição estabelecida por Diawara. O objetivo da comunicação proposta é analisar a evolução da questão da auto-representação no cinema africano, tentando superar essa polarização. |
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Bibliografia | BARLET, Olivier. Postcolonialisme et cinéma : de la différence à la relation. Africultures, no 28. Paris : l’Harmattan, mai 2000.
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