ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | Projeto Mutirão: um filme não-realizável, uma prática documentária |
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Autor | Graziela Kunsch |
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Resumo Expandido | Esta comunicação acadêmica irá assumir a forma de apresentação de um trabalho prático, e vice-versa. Usarei linguagem simples e direta, como esta:
O Projeto Mutirão – e daí a importância de ser intitulado como “projeto” – não é um filme curta, média ou longa-metragem, mas se confunde com a minha própria prática de documentarista. Há mais de cinco anos acompanho ações de movimentos sociais, especialmente movimentos de moradia e o Movimento Passe Livre, que defende a gratuidade no transporte coletivo. Tento estar presente com a minha câmera de vídeo observando/vivendo diferentes situações, nas quais identifico a produção de um outro espaço, de uma outra cidade. São muitas horas registradas, que poderiam render um ou mais documentários. Mas, entendendo as lutas políticas como um processo interminável, não quis delimitar um fim para meu trabalho. Achei mais apropriado assumir o que venho fazendo como uma prática documentária, uma ação que tem continuidade e que não é direcionada para um produto. O Projeto Mutirão reúne uma série de vídeos formados por um único plano cada. Chamo estes planos de excertos, na tentativa de dizer que se trata de momentos, de peças de um processo maior. Aqui, como exemplo, irei mostrar dois excertos, um com duração de apenas trinta segundos, outro de três minutos. A cada apresentação do projeto escolho excertos diferentes para mostrar e comentar, gerando narrativas únicas, que não se repetem. Os excertos permitem combinações múltiplas, tornando possível que eu utilize o Projeto Mutirão em diferentes contextos e com diferentes discursos. No caso do XIII Encontro da Socine, acredito que uma das minhas contribuições teóricas seja comentar a proposição do termo “excerto” no lugar de “plano-sequência”. André Bazin criou esta expressão para definir os planos longos de filmes como O balão vermelho (Albert Lamourisse, 1956), que cumpriam a função dramática da seqüência de planos no esquema de decupagem clássica. Mas o que se passa em filmes como Cinco, de Abbas Kiarostami? Um plano contínuo que, por 17 minutos, observa cachorros junto ao mar pode ser analisado tendo como referencial o cinema clássico? Ou exige outros métodos de análise, um outro vocabulário? Outra referência que poderei abordar são os ciné-tracts de maio de 1968 (que posteriormente Godard chamou de film-tracts): filmes feitos coletivamente, sem a assinatura de um diretor. O Projeto Mutirão reúne excertos produzidos por diferentes fotógrafos, apesar de a maioria dos excertos já coletados terem sido capturados por mim. Há uma série de conceitos e referências que posso mobilizar ao longo desta comunicação oral, mas o que mais me interessa enfatizar é a forma aberta do Projeto Mutirão – não no sentido de “obra aberta” de Umberto Eco (obra aberta a diferentes interpretações), mas aberta por ser eternamente processual, sempre ganhando novos excertos e assumindo diferentes formas. Aberta por não se enquadrar em nenhuma categoria, em um exercício permanente de busca por outras formas de se fazer cinema, arte e política. Citando Susan Sontag, “o padrão de início, meio e fim não mais se aplica. A incompletude torna-se a modalidade dominante da arte e do pensamento, dando origem a antigêneros – obra que é deliberadamente fragmentária ou auto-anulatória, pensamento que desfaz a si mesmo. Porém, o destronamento vitorioso de velhos padrões não requer que se negue o fracasso de tal arte. Como diz Cocteau, ‘a única obra bem-sucedida é aquela que falha’”. |
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Bibliografia | ALMEIDA, Jane de (org). Grupo Dziga Vertov. São Paulo: Witz, 2005.
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