ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | A modernidade Baudelaireana em Barry Lyndon, de Stanley Kubrick |
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Autor | Maira Cinthya Nascimento Ezequiel |
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Resumo Expandido | O elogio a uma arte que fosse fiel à visualidade de seu próprio tempo é a tônica dos textos de Baudelaire sobre o que chamou de Modernidade. No clássico texto, Baudelaire defende que aquele era um momento em que a arte deveria estar imbuída de dar visibilidade a seu presente. Ele marca a legitimação do presente como história, da fidelidade ao visível, opondo-se a idéia clássica de Belo natural. Baudelaire exalta o belo contido nas coisas, nas pessoas e nos artefatos do mundo. Para Marc Jimenez, “aqui, neste ‘transitório’ e neste ‘fugitivo’ que, em sua[de Baudelaire] opinião, caracterizam a época moderna, residem as inumeráveis rupturas que conferem, provisoriamente, uma coerência original à modernidade.” Baudelaire critica duramente o paisagismo que se pretende impor como cópia fiel, mas o faz para exaltar os representantes deste gênero que demonstram ter consciência e saber fazer bom uso da condição de ilusão imposta a esta pintura. Há neste ponto uma aproximação possível com o trabalho de Stanley Kubrick na construção da visualidade em Barry Lyndon: na tentativa de criação de um sentido de verdade a partir da visualidade do filme, Kubrick constrói uma correspondência plástica entre o modo de representação da realidade diegética e um determinado referencial pictórico realista do século XIX – mais precisamente em algumas obras de Constable, Corot, Courbet e Millet.
Decerto, para aquele grupo de pintores Realistas, a preocupação com a criação de um estilo que desse conta da realidade da forma como ela se apresentava aos olhos foi a principal motivação de suas obras. Uma inquietação da mesma ordem da que ocupou Kubrick. A relação com Baudelaire está na busca da verdade histórica, temporal e estética das impressões pessoais desses artistas. A impressão de realidade que brota do filme consiste na captura do visível fugidio, uma cor de céu, uma luminosidade que invade o ambiente por alguns segundos do dia, ou um tom amarelado de luz de velas que aos poucos se decompõe em tons mais graves, acompanhando a decomposição do próprio material. Mas de tão fugidios, os detalhes que dão à pintura realista sua beleza maior são justamente aqueles que se compõem no imaginário do artista. Detalhe que, no fundo, distancia o realismo de um programa de todo comprometido com a fidelidade ao real extremo. E Baudelaire não só era ciente disto como era a isso que parecia se referir naquele momento. Ou seja, tratava-se na verdade da criação de algo da ordem da ilusão de uma realidade, ou – como, paradoxalmente, diria ele próprio, do elogio à mentira. Do ponto de vista da forma, Barry Lyndon está repleto de planos gerais fixos, longas tomadas externas, zoom-outs, panorâmicas, geralmente emolduradas por paisagens sublimes nas quais a ação se desenvolve na profundidade. Grandes massas de nuvens, céu, montanhas, rios ou outras paisagens naturais costumam tomar conta da maior parte do quadro. A iluminação é predominantemente natural. Nas cenas em ambientes internos, a luz externa invade por todos os lados através de fontes sempre reveladas. É famosa a experiência de Kubrick neste filme com lentes super-sensíveis na filmagem das cenas noturnas iluminadas velas. No tocante ao conteúdo, a tensão criada entre o tom irônico da narração over e o anti-heroísmo do personagem principal, em sua tentativa frustrada de ascensão social, também se aproximam desta tal mentira Baudelaireana, principalmente quando confrontadas com a visualidade fotográfica apresentada. No fundo, nada é tão sublime assim. Portanto, a hipótese apresentada neste trabalho seria a de que Kubrick realiza na forma deste filme o desejo Baudelaireano de um efeito de real pela motivação de reproduzir o mundo tal qual era visto por quem o vivia. No limite, ao mimetizar a plasticidade realista na fotografia de Barry Lyndon, Kubrick parece fazer emergir uma certa ilusão da realidade próxima ao que Baudelaire chamou de Modernidade. |
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Bibliografia | ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna, São Paulo: Companhia das Letras, 1992
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