ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | Fotografia, cinema e política no acervo de Ruy Santos |
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Autor | Maria Teresa Ferreira Bastos |
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Resumo Expandido | O Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro é o guardião desde 1992 de documentação textual e iconográfica produzida e apreendida pela implacável e obsessiva Policia Política Brasileira atuante por mais de sessenta anos no controle e repressão da sociedade. Esse material compõe o Fundo Polícias Políticas constituído por 750 metros lineares de documentos textuais, 100 mil fotografias, negativos em acetato e de vidro, microfilmes; documentos sonoros e filmes; além de objetos tridimensionais.
Dentre esse vasto acervo, destaca-se a obra de Ruy Santos (1916-1989), fotógrafo e cineasta que dirigiu mais de 30 documentários, dos quais alguns foram premiados no Brasil e exterior. De sua estréia ainda jovem como assistente de fotografia do lendário filme Limite (1930), de Mário Peixoto, até sua morte em 1989 foram mais de 47 anos de cinema e fotografia. Carioca e comunista, Ruy Santos registrou em película muitas personalidades do Partido nos anos 40 e 50, além de momentos importantes da história do comunismo no Brasil, como comícios realizados em várias cidades brasileiras a favor de Prestes, entre eles, o maior, realizado no estádio do Pacaembu, em 15 de julho de 1945, em São Paulo. Provavelmente as cópias fotográficas encontradas de Ruy no APERJ são as únicas remanescentes de seu acervo, destruído pela Polícia por ocasião de sua prisão em 1948. No total existem comprovadamente 64 imagens de sua autoria e mais 200 "prováveis". O curioso é que essas fotografias localizadas no APERJ são, em sua maioria, stills de um curta-metragem realizado por Ruy em 1945. Mas essa informação não era previamente dada, já que não se tinha conhecimento do filme até recentemente. As fotos, contudo, denunciam certa continuidade, como se não fossem imagens únicas, peculiares à linguagem fotográfica. Elas transmitem ainda uma certa atmosfera fake, de simulação, que destoam do traço documental de outras imagens de Ruy presentes no acervo. Intitulado "Comício: São Paulo a Luiz Carlos Prestes", o filme tem 9min e 14 seg de duração. Com tom heróico, realça o aspecto grandioso, de grande espetáculo político-partidário que o PCB estava interessado em difundir naquele momento. Com direção e fotografia de Ruy, o filme foi produzido pela Cinédia com realização do Comitê Nacional do Partido Comunista. Percebe-se que o cineasta se esmera no cuidado visual das imagens, explorando com maestria o controle da luz dura, incidente em algumas cenas. Consegue resultados gráficos ao enquadrar o estádio vazio, em que luz e sombra traçam linhas visuais, comuns à fotografia moderna. Suas imagens não são de ousadia estética, com exploração de ângulos inusitados, características de um Rodchenko, mas são apuradas e tentam carregar de mais poder o documentário, diante do texto narrado. Na verdade, ao vê-las sem a interferência do som, sem a coerência narrativa do filme, pode-se desfrutar e captar o esforço do fotógrafo em torná-las simbolicamente mais fortes que o texto. Ruy foi um dos fundadores da Liberdade Filmes, produtora cinematográfica do Partido Comunista e também diretor do primeiro documentário sobre o PCB, "24 anos de lutas: como se formou o partido comunista do Brasil". O filme foi rodado em 1945, para o qual Ruy registrou Prestes ainda na cadeia e está desaparecido desde 1947. O que restou dele foi somente o roteiro, arquivado no APERJ. Apesar de extensa cinematografia, Ruy Santos é desconhecido do público e de pesquisadores. Ruy era comunista, comungava, como muitos artistas e intelectuais da época, dos ideais e da perspectiva do PCB, mas fica evidente em seu trabalho que era mais um artista a favor do partido que um panfletário. Política e arte se entrelaçavam nos áureos tempos do Partido comunista. Como essa experiência estética pode contribuir contemporaneamente para as questões de poder e imagem suscitadas pela espetacularização midiática? Como se colocar diante dessas imagens resistentes de Ruy? Essas são algumas questões que se pretende desenvolver. |
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Bibliografia | MACHADO, Hilda. Algumas perguntas a fotogramas de Ruy Santos. Cinemais: revista de cinema e outras questões audiovisuais, Rio de Janeiro, v. 35, p. 196-207, 2003.
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