ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | Da Terra em transe à Terra estrangeira: uma mudança paradigmática |
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Autor | Bruna Hetzel |
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Resumo Expandido | Este trabalho discute as transformações experimentadas pelo cinema brasileiro contemporâneo tomando por base a narrativa cinematográfica “Terra Estrangeira”, de Walter Salles. O contexto político apresentado pela película coincide com o período crítico atravessado pelo setor do audiovisual nas últimas décadas, cujo ápice é registrado pela assunção do presidente da República Fernando Collor de Mello, em 1990. Percebemos esse cenário de crise não apenas pelo seu viés econômico, mas como parte da emergência de uma nova visão sobre a atividade cinematográfica que inclui transformações éticas e estéticas. Ao contrário do que afirmam alguns comentadores no campo do cinema, a exemplo de Lúcia Nagib, e Ivana Bentes, acreditamos que os filmes produzidos no tempo presente não são menos políticos do que os que foram produzidos no âmbito do Cinema Novo brasileiro. O cinema que tem sido produzido no Brasil parece caminhar em sintonia com a atmosfera global. Ele emerge em um momento de transição, em que idéias como a de originalidade, pureza, identidade começam a ceder espaço à aceitação do híbrido e do contraditório. As concepções de política e de estética também estão sujeitas a transformações seminais.
Neste trabalho, apontamos o cinema de Walter Salles como uma manifestação sensível do percurso citado, que se aproxima da idéia de “cinema impuro”, elaborada por Luis Z. Oricchio: um cinema que combina a abordagem crítica dos temas sociais, legado do Cinema Novo brasileiro, aos padrões do entretenimento e ao diálogo com linguagens estrangeiras. Afastando-se dos ideais nacionalistas e de uma aposta revolucionária mediada por um embate classista, seus filmes delineiam uma proposição política de cunho humanista que passa por uma re-fundação ética. Em Terra Estrangeira esta dimensão ética se corporifica nas experiências existenciais dos protagonistas e nos seus singulares encontros com a alteridade. Partimos dessas vivências fictícias e do contexto criado pelo filme e tecemos uma reflexão acerca da sociedade “líquido-moderna”, dialogando com autores como Zigmunt Bauman, Edgar Morin e Julia Kristeva. Terra Estrangeira articula a problemática da política institucional brasileira e da migração internacional a um questionamento ético que se centra na compreensão da ausência generalizada de uma atmosfera de hospitalidade. O filme desperta essa reflexão acerca da necessidade de hospitalidade no mundo atual ao revelar personagens que atravessam situações de perda e abandono profundos, imagens que pedem por um mínimo de acolhimento. A narrativa se dá do ponto de vista de personagens estrangeiros, aqui entendidos como os outros da nacionalidade, aqueles que não pertencem ou não estão incluídos no Estado-nação (segundo a concepção de Julia Kristeva). No filme, o estrangeiro está representado na figura do migrante econômico, mas também naquele que na ausência de condições materiais de existência, ou seja, na falta de amparo social, se sente estrangeiro em seu próprio território. O filme é repleto de simbologias que transmitem a sensação moderna da estrangeiridade e do desamparo em um mundo globalizado em que ocorre uma progressiva diluição das fronteiras econômicas, mas que ainda enfrenta sólidas barreiras à livre circulação de pessoas. |
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Bibliografia | BAUMAN, Zigmunt. “Vidas Desperdiçadas”. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. 2005.
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