ISBN: 978-85-63552-05-1
Título | A resistência que se (re)inventa |
|
Autor | André Guimarães Brasil |
|
Resumo Expandido | Desde o princípio, o documentário se cria pela resistência de seus objetos. Afinal, o que define a prática documentária é justamente o processo por meio do qual diretor e personagens se tornam sujeitos, na escritura do filme, a partir de uma resistência.
Essa formulação aparentemente simples se complica se aceitarmos a provocação de Jacques Rancière: “O que fazer com a homonímia da palavra “resistência” que contém várias idéias numa palavra só?” Afinal, resistir pode significar noções distintas e até mesmo contraditórias: algo resiste quando persiste naquilo que é, algo resiste quando não se contenta com a sua situação, quando não deseja permanecer aquilo que é. No documentário, a resistência não existe fora do filme. Ela se engendra na mise-en-scène, na relação entre dois sujeitos que se criam no filme, em suas estratégias. A pergunta de Rancière deve, então, se desdobrar em outras: qual é, em cada filme, o sentido da palavra resistência? De que modo ali se resiste? Como se passa, na obra, de objeto a sujeito (ou de sujeito a objeto)? Estas questões nos parecem centrais para se pensar o documentário brasileiro. Diante de personagens e de espectadores que perderam a inocência (Comolli, 2008), diante de certo esgotamento dos modos de representação do documentário, os diretores se tornam espécies de metodólogos. Eles precisam inventar formas de abordagem que favoreçam processos de subjetivação imprevisíveis, abertos ao risco e ao acaso, que permitam escapar das expectativas cada vez mais decantadas no domínio do espetáculo. Os diretores devem então, a cada filme, provocar e reinventar a resistência, em um corpo a corpo com os personagens e com a escritura do filme. Assim, a resistência dos sujeitos que filmam e dos sujeitos filmados se inventa, se joga. Poderíamos nos apropriar da expressão de Jean-Luc Nancy para dizer que a política do documentário se exerce como um “em jogo do em comum” (Nancy, 2004). Vale dizer, a abertura “metodológica” de alguns documentários não garante sua potência política, não garante que as resistências que se inventam produzam efetivamente subjetivações. Muitas vezes, o jogo pode, ao contrário, engendrar processos de dessubjetivação (Agamben, 2007). O ensaio fílmico têm sido um espaço privilegiado no qual essa reinvenção da resistência se experimenta. Porque, no ensaio, nos distanciamos tanto do roteiro quanto do fato. Os modos de subjetivação que nele se produzem não se determinam a priori, eles só podem se constituir, de um lado, na experiência, de outro, na escritura da obra. Nessa comunicação, gostaríamos de pensar o processo de subjetivação que se opera em três ensaios fílmicos realizados no Brasil: Serras da Desordem (2006), de Andrea Tonacci, Santiago (2007), de João Moreira Salles, e Pan-Cinema Permanente (2007), de Carlos Nader. Nos termos que nos interessam aqui, trata-se simplesmente de perguntar como, em cada filme, sujeitos se produzem a partir do modo distinto como resistem. |
|
Bibliografia | AGAMBEN, Giorgio. Qu’est-ce qu’un dispositif? Paris: Ed. Payot & Rivages, 2007.
|