ISBN: 978-85-63552-06-8
Título | O Local, o Comum e o Mínimo |
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Autor | Denilson Lopes Silva |
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Resumo Expandido | Se cada vez mais marcado pelos fluxos midiáticos, migracionais e de mercadorias, “o local costuma estar em outro lugar” (CANCLINI, 2008, 60), como pensar o local e o homem comum hoje? Em contraponto com a pequena cidade de Um Coração Simples (1877) de Flaubert situado no meio do século XIX ou ainda no vilarejo de um tempo indistinto mas possivelmente o século XX de Uma Vida em Segredo (1964) de Autran Dourado, nos filmes que vamos discutir cada vez mais a autonomia do local é redimensionada pelo consumo de mercadorias provenientes dos mais diversos lugares, pelas imagens televisivas, pelo que se ouve no rádio e pelos trânsitos entre culturas. Não se pode pensar o local como antes da cultura midiática e da ampliação das redes de transportes que possibilitam cada vez mais viagens transcontinentais não só dos membros de elites culturais e econômicas mas de trabalhadores legais ou clandestinos em busca de melhores condições de vida. As pequenas cidades, ainda que em menor escala do que as metrópoles e cidades globais, também estão conectadas às paisagens transculturais. Por sua vez, O homem comum não é o homem pobre do Naturalismo, definido pelo determinismo geográfico e racial, nem a encarnação da cultura da periferia, estigmatizado pelas várias exclusões sociais, econômicas, raciais, de gênero. O comum é uma construção transversal que atravessa identidades mas não as elimina e talvez, no contexto global de hoje em dia, atrevesse culturas.
Tentaremos mapear esta questão no cinema contemporâneo através dos filmes de Jia Zhang-Ke, irmãos Dardenne, Lucrecia Martel, Lisandro Alonso, Bruno Dumont e Pedro Costa articulados dentro de uma dramaturgia minimalista que se diferencia das propostas alegóricas, naturalistas e/ou melodramáticas ainda presentes no cinema brasileiro contemporâneo. Mesmo tentativas recentes em se aproximar do que estamos mapeando como "Linha de Passe" de Walter Moreira Salles e Daniela Thomas e "No meu Lugar" de Eduardo Valente acabam por se frustrar. Nosso passeio por estes filmes reafirma a importância de colocar não só o cotidiano mas a experiência do homem comum num quadro transnacional. Trata-se não só de um tema mas de uma questão formal presente na construção espacial, de personagens que pouca falam, de origem humilde, não-intelectualizados, pouco reflexivos e na valorização de não-atores e de uma dramaturgia da contenção e da rarefação. Também parece que o caminho que seguiremos não é a discussão de uma proposta do documentário contemporâneo como sugerida por Cesar Guimarães. Para frisarmos a importância do debate estético, deixo uma última sugestão que precisa ser melhor desenvolvida. Do ponto de vista dramatúrgico, não se trata de voltar ao melodrama (ou, de resto, a qualquer tipo de gênero, tão a gosto da sensibilidade pós-moderna dos anos 80 marcada pelo pastiche), que vê no dilaceramento afetivo, nas lágrimas e gestos grandiosos, uma esperança de uma vida bem menos ordinária, seja em tom sério ou sob o signo do kitsch, do camp ou mesmo do trash. Nenhum excesso, nem de risos nem de lágrimas, nem do transe tribal, dionisíaco, de Glauber Rocha e de José Celso Martinez Correa, do Carnaval, das festas eletrônicas e dos bailes funks. Estamos, estou bem longe, de Sade, Jarry e Artaud bem como do deboche antropofágico-tropicalista. A opção é pelo registro da contenção e da essência do minimalismo que busca o máximo de sentido como o mínimo de expressão que implicará uma necessária aproximação entre cinema, teatro e artes plásticas para redimensionar esta proposta estética transnacional. |
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Bibliografia | AGAMBEN, Giorgio. The Coming Community. 4a.ed., Minneapolis, University of Minnesotta, 2003.
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