ISBN: 978-85-63552-06-8
Título | O muçulmano no cinema brasileiro – do clichê à indiferença |
|
Autor | Ivonete Pinto |
|
Resumo Expandido | O trabalho pretende indexar os filmes que apresentam personagens muçulmanos, trazendo títulos onde surge a figura folclórica do sultão, como na chanchada Barnabé Tu És Meu (1952), até os mais recentes, como Lavoura Arcaica (2001), onde os sermões do patriarca da família são citados diretamente das suras do Corão. Um levantamento prévio apontou um número reduzido de obras com personagens muçulmanos. A investigação tentará dar conta da razão pela qual o cinema brasileiro não tem se ocupado destes personagens, considerando que os adeptos do islamismo formam uma população crescente, com cerca de 1,5 milhão de fiéis no País. A invisibilidade desta população no cinema nacional será cotejada com a filmografia que explora outras religiões e dialoga com as linhas de pesquisa baseadas no tripé memória-imigração-orientalismo.
A história dos muçulmanos no Brasil nos remete aos escravos de origem africana islamizada, os malês, que protagonizaram uma importante rebelião em 1835, mas que até hoje não foi tema de qualquer filme. Na história contemporânea do País, temos que a maior parte dos muçulmanos vindos para cá são de origem sírio-libanesa. No entanto, a expressão “turco” sempre foi a mais comum para designá-los. De fato, foi só depois da Segunda Guerra que a imigração dos árabes muçulmanos ao Brasil cresceu, principalmente a palestina depois da criação do estado de Israel, em 1948, e a libanesa, depois da guerra do Líbano de 1975. Até então, a maior parte dos árabes que se estabeleceram no país era cristã. A Palestina, um estado ainda em construção, e o Líbano, não têm a sharia como lei maior, mas estão inseridos no contexto em que a religião faz parte de suas vidas cotidianas de forma inextrincável, como a reza 5 vezes ao dia e o cumprimento ao Ramadan. Nada disto, porém, transforma-se em elemento narrativo nos filmes em que “seriam” representados no Brasil. Os poucos filmes que mostram muçulmanos trazem personagens construídos a partir de clichês, onde são o "outro". Um "outro" incompleto, parcial, comumentemente valorizado como peça cômica. Considerando que, paralelo à disputa pela energia atômica, o mundo disputa o poder do imaginário coletivo através do meio audiovisual, o muçulmano, no Brasil, tanto o imigrante como o convertido, não está promovendo a sua representação neste meio. E a pouca representação que possui, não tem gerado reflexão. Vários autores se debruçaram sobre o papel do colonizado e do colonizador, os discursos de cada um, como o jamaicano Stuart Hall, o palestino Edward Said, o indiano Salman Rushdie, o antilhano Frantz Fanon e o indu-britânico Homi Bhabha. São colonizados que compreenderam a questão a partir de um ponto de vista privilegiado, de dentro. Apesar do muçulmano que vive no Brasil não ser um colonizado, mas um imigrante, descendente de ou convertido, não há autores de dentro de suas comunidades que, até agora, tenham tido interesse em refletir sobre a representação de seu grupo no cinema brasileiro (ou a falta desta representação). Esta reflexão está longe de ser presença também nos estudos culturais na academia. Há ainda um outro viés a ser observado. Se até aqui o árabe (incluindo cristãos e muçulmanos) era representado da forma descrita como o “turco”, o “comerciante”, o “engraçado”, a partir de 11 de setembro de 2001, com o ataque às torres gêmeas em Nova York, todo indivíduo oriundo de uma provável “diáspora de Alá”, adquire outra representação, a considerar a produção fílmica americana e européia recentes. No Brasil, o único filme a tratar do tema, mesmo que indiretamente, é Jean Charles (2009). Um exemplo de quão distante o muçulmano que vive no Brasil está, na forma da representação no cinema nacional, é a resposta que o departamento cultural do Centro Islâmico no Brasil deu a esta pesquisa. Maior entidade a congregar muçulmanos no país, com site em cinco línguas, a resposta, por e-mail, foi esta: “Em nome de Deus. Desconhecemos pesquisadores trabalhando no tema.” |
|
Bibliografia | BHABHA, Homi. O Local da Cultura. Belo Horizonte: UFMG, 2005.
|