ISBN: 978-85-63552-06-8
Título | Mangue Negro, um filme de bordas-remix |
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Autor | Bernadette Lyra |
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Resumo Expandido | Sendo um campo do conhecimento marcado por constantes expansões e transformações, não só influenciado pelas mutações de formatos e tecnologias, mas também influenciando os processos dinâmicos da sociedade, o cinema não escapa à condição que dá forma a todos os demais campos em ação na cultura e na sociedade de hoje. Assim, os gêneros também já não podem ser vistos apenas sob o prisma de estudos tradicionalmente postos, como os de origem semiológica (Christian Metz) ou de coordenadas teóricas de inspiração no formalismo russo, baseadas nas articulações entre os planos, em termos de espaço e tempo (Gunning). É necessário introduzir conceitos que dêem conta das preocupações teóricas atuais, tal como o conceito de remix, o qual, a partir do trabalho dos DJ’s do hip hop, passou a reger toda uma formulação cultural contemporânea. “Na crise da criação pós-moderna (“a arte morreu!”) só é possível apropriações sob o signo da recriação” (André Lemos, Professor da UFBA). Mais que nenhum outro fazer cinematográfico, o cinema de bordas se constitui exatamente nesse espaço remixado de desvios, apropriações e liberdade de recriações. E por estar assentado, em particular, sobre a perversão dos gêneros - aqui entendidos como uma noção “estritamente solidária de certos sistemas de produção e difusão de filmes, e também como um produto teórico desses mesmos sistemas” (Grilo: 1997, 145) – o cinema de bordas se presta às demonstrações do presente trabalho. Para exemplificar esse assunto, faço a análise da constituição performática do filme Mangue Negro (2008), de Rodrigo Aragão. O filme é uma mescla de crítica ecológica, humor negro, fotografia escura, cenários reais, muita lama, sangue, vísceras, corpos em decomposição e tomadas que lembram outros filmes de horror já vistos, como os de Peter Jackson (ex. Trash - Náusea Total, 1987); Sam Raimi (ex. a trilogia Uma noite alucinante, 1982, 1987, 1993) e George Romero (ex. A Noite dos Mortos Vivos, 1968). A narrativa se desenrola com muitos fades que separam as seqüências, com um procedimento usual em HQs, e com muitas repetições (como a fala “Raquel, eu quero te dizer uma coisa” que o mocinho exclama ao longo do relato, e que sempre é interrompida pelo ataque de um morto-vivo). Ao fio condutor de um amor romanticamente nunca consumado, mesclam-se práticas místicas de ressurreição, benzeduras de pretas velhas, histórias de pescadores, peixes podres, crustáceos estragados, fatos corriqueiros da vida comunitária em um vilarejo do Espírito Santo e criaturas comedoras de carne humana que se levantam do mangue poluído. Mas, ao lado do frisson do terror, o filme provoca risos nos espectadores. E, ao invés de uma música coerente com tanto pavor, como seria previsível, tudo vem embalado por uma sinfonia clássica, do maestro Jaceguay Lins, executada pela Orquestra Sinfônica do Espírito Santo. Como tantos filmes periféricos de bordas, Mangue Negro foi feito com baixo orçamento e recursos precários, em uma cidadezinha do interior por um realizador autodidata, com atores amadores que fazem parte do círculo de amigos e conhecidos do diretor. Nota-se a tosca confecção do figurino e da maquiagem na confecção dos zumbis. A sangueira é claramente tinta e molho de tomate. Nada do esplendor da tecnologia de ponta que torna possível a remixagem de sons e de imagens, atualmente. Mas, sua importância para esta comunicação é que ele fornece uma outra dimensão para a análise e abre espaço para uma introdução ao estudo da cultura remix no cinema brasileiro. |
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Bibliografia | ALTMAN, Rick. Film/Genre. Londres:BFI,2004.
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