ISBN: 978-85-63552-06-8
Título | Madame Satã e Onde a Coruja Dorme: para além dos clichês do samba. |
|
Autor | Rodrigo Guéron |
|
Resumo Expandido | Madame Satã e Onde a Coruja Dorme: para além dos clichês do samba:
A nossa apresentação pretende analisar dois filmes bastante distintos, Madame Satã, de Karim Aïnouz e Onde a Coruja Dorme, de Simplício Neto e Márcia Derraik, um de ficção e o outro documentário, procurando mostrar como ambos conseguem fugir aos clichês de filmes sobre o samba, aos clichês do samba de uma maneira geral, e finalmente aos clichês que envolvem corpos e imagens ( corpos-imagens) dos homens e das mulheres negras no Brasil. Em ambos filmes, então, o samba é, pelo menos parcialmente, arrancado de alguns de seus clichês e redescoberto numa tensão limite entre violência e resistência, respectivamente sobre os corpos e a partir dos corpos. Trata-se de uma tensão que pode ser descrita também como sendo a da ação do biopoder( REVEL, Judith. 2005) de um lado, e a da resistência biopolítica de outro; com o cuidado, evidentemente, para não cairmos em polarizações simplificadoras. O percurso que nos fez chegar a esta questão começou, sem dúvida, em nossa tese de doutorado em Filosofia (GUÉRON, Rodrigo 2004) onde trabalhamos o tema do “clichê” a partir da definição que o filósofo Gilles Deleuze faz deste conceito no seu segundo livro sobre cinema “Imagem-Tempo”, qual seja, o clichê como um “esquema sensório motor”(DELEUZE, Gilles. 1983). Partindo desta definição, de inspiração bergsoniana, e que vê o clichê como um fenômeno que acomete o corpo em sua experiência cotidiana de apreensão do real –experiência que é sempre de uma imagem – , chegamos à “moral” na maneira com Nietzsche a concebe. Dito de outra forma: percebemos que o processo de instalação de um clichê é “ fisiológico” ( que se refere ao corpo [NIETZSCHE, 2004]), e portanto extremamente semelhante à experiência da moral como se dá em nós segundo este filósofo. Definimos então o clichê como uma “Imagem-moral” , ou uma “Imagem-lei”: uma imagem que funciona como uma espécie de índice determinador e padronizador de valor. Foi este percurso que nos permitiu chegar à biopolítica, escrevendo posteriormente a tese um artigo publicado na revista Concinnitas onde falamos a dimensão política do cinema da imagem- tempo, cinema que, segundo Deleuze “(...)se torna inteiramente político, mas de outra maneira” (DELEUZE, Gilles. 1983). Foi exatamente as descrições e estudos que fizemos do clichê, e das distintas maneiras de como podem acontecer a detecção, a denúncia, a superação e as quebras dos clichês, que nos permitiu afirmar que a dimensão política do cinema moderno é sempre, de certa forma, uma dimensão biopolítica. Por outro lado, o tema de nossa apresentação já estava presente num estudo que publicamos na revista Multitudes denominado “Clichês do Samba, Potências do Samba, linhas de fuga e capturas na cidade do Rio de Janeiro”, que mostrava o samba e suas manifestações como expressão da resistência aos processos do higienistas do biopoder– a biopolítica do poder – no Rio de Janeiro. O samba, portanto, na sua dimensão de resistência biopolítica, quase sempre num jogo de gato e rato com o poder – de linhas de fuga e captura –, onde estas capturas se dão exatamente como uma espécie de disciplinamento e uma despotencialização em clichês das performances, dos corpos e dos territórios do samba. Clichês para os quais o cinema brasileiro de um lado contribuiu para constituir, de outro para quebrar. Os dois filme supracitados então, Madame Satã e Onde a Coruja Dorme, nos pareceram bem sucedidos, pelo menos parcialmente, na maneira como conseguiram escapar aos clichês com os quais o samba, os sambistas, suas manifestações, e os homens e mulheres negras em geral, apareceram em diversos momentos não só do cinema brasileiro, mas de grande parte da produção audiovisual, e do todo um “imaginário constituído”, expressão do biopoder na sociedade brasileira. |
|
Bibliografia | DELEUZE, Gilles. L`Image-Temps. Paris, Lês Edition de Minuit, 1983.
|