ISBN: 978-85-63552-06-8
Título | Como o roteiro pode (e deve) prever o estilo da direção! |
|
Autor | Newton Guimarães Cannito |
|
Resumo Expandido | O estilo da escrita já prevê um estilo de direção. O importante é o roteirista ter a consciência que ao escrever ele deve descobrir um estilo de cinema. Nem sempre esse estilo está previsto no inicio do processo. Muitas vezes ele vai sendo descoberto no próprio ato da escrita e – muitas vezes – no próprio ato da direção. Isso complica um pouco a tradicional “divisão” de trabalho entre “roteirista” e “diretor” . Mesmo que eles tenham funções separadas torna-se importante um maior diálogo dentro da equipe, para que o estilo do filme seja descoberto em conjunto.
Analisei de forma sucinta três diferentes objetos: o seriado “9mm”, o documentário “Jesus no Mundo Maravilha” e o seriado “Elvis e o Cometa”. A análise será sintética e irá direto para as conclusões, pois é o objetivo da comunicação é mostrar a importância de pensar o estilo do filme desde a etapa do roteiro. Em “9mm” partimos de um projeto que era, inicialmente, uma série de investigação policial num modelo CSI. Mudamos isso logo de cara. Reduzimos a investigação e decidimos focar nos dramas dos personagens. Aos poucos concluímos que o enredo era uma tragédia moderna (no sentido analisado por Raymond Willians) e começamos a trabalhar com a “não ação” dos personagens. No entanto, a consultoria da FOX , reorientou os trabalhos. Pediam mais ação. A tensão foi aumentando e as cenas foram ficando mais concisas, também por limitações de tempo de cada episódio. Junto com o diretor e produtor definimos um estilo visual meio expressionista, que remete aos filmes noir. A interpretação dos atores foi para altos tons. E começamos a inserir momentos psicológicos, aonde a direção expressa sensações e delírios. Aos poucos fui sacando a proposta estética da série, .que surgia naquele grupo criativo, de roteiristas, produtor e diretor. A série não era realista, era naturalista. Não no sentido televisivo do termo, mas no sentido de naturalismo literário de Zola. E era uma vertente do naturalismo que já dialoga como surrealismo, num estilo próximo aos melodramas de Bunuel e analisado por Deleuze no capitulo “A imagem Afecção”, do livro “A imagem movimento”. Ao entender o estilo que estávamos criando voltamos ao roteiro e acertamos o tom da escrita, adequando o roteiro a proposta estética do conjunto da obra. Resumindo: a série tem enredos de tragédia moderna, em tom de naturalismo surreal. “Jesus no Mundo Maravilha” surgiu de um projeto chamado “Fatalidade”. A ideia era mostrar em paralelo um policial que matou um homem circunstancialmente e uma vitima. E mostrar como a coisa toda tem motivos maiores, públicos, ligados a cultura da corporação policial. Mas a policia não permitiu filmar com o policial. Tive que mudar o projeto e só entrevistar policiais exonerados. Descobri alguns que trabalhavam num parque de diversão. Fui filmar lá e fiquei fascinado com o ambiente. Conheci um palhaço chamado Maravilha. E decidi que ele poderia entrar no filme. Logo nesse primeiro dia de filmagem reescrevi o projeto. Mudei o gênero.Saiu de tragédia moderna e foi para farsa política. Dentro dos princípios da farsa construi personagens caricaturais que revelam suas paranóias e loucuras em clima de brincadeira. Usei o espaço do parque como recurso de direção para distanciar do drama. Decidi fazer tudo no parque e trabalhar com uma estética do espetáculo critico, que remete as obras tropicalistas e a arte pop. A trilha sonora e a montagem também trabalharam no mesmo sentido. A proposta estética do filme mudou completamente e todo o padrão de direção se transformou.A montagem foi orientada no mesmo sentido e buscou deslocamentos permanentes, visando causar o choque no público. No caso de documentário é ainda mais premente a importância de ter um projeto estético antes das filmagens. Como não trabalhamos com um roteiro de diálogos e cenas, o projeto estético e o modo de produção são os princípios que orientam as filmagens. O roteiro foi sendo construído na ilha de edição, em paralelo as filmagens. |
|
Bibliografia | AUMONT, Jacques. O olhar interminável. São Paulo, Cosac y Naif, 2004
|