ISBN: 978-85-63552-06-8
Título | O acontecimento transmitido e a resistência pela imagem |
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Autor | Julia Gonçalves Declié Fagioli |
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Resumo Expandido | Este trabalho consiste na análise dos filmes: Videogramas de uma revolução (Alemanha, 1992) de Harun Farocki e Andrei Ujica e A revolução não será televisionada (Irlanda, 2003) de Kim Bartley e Donnacha O’Briain. Utilizando imagens que foram transmitidas ao vivo, cada filme trata de acontecimentos políticos particulares. O objetivo é perceber diferentes pontos de vista de um mesmo acontecimento na ocasião de seu deslocamento da televisão para o cinema.
A televisão possui uma estética relacionada às particularidades do seu tempo. A duração da transmissão direta corresponde à dos acontecimentos registrados. O ao vivo talvez seja a forma de se comunicar mais específica da televisão. De acordo com Philippe Dubois (2004), “O que especifica a maquinaria televisual é a transmissão. Uma transmissão à distância, ao vivo e multiplicada. Ver, onde quer que haja receptores, o mesmo objeto ou acontecimento, na forma de imagem, em tempo real e estando sempre longe ou alhures”. (DUBOIS, 2004: 46). A imagem televisiva circula sempre no presente e se aproxima do acontecimento ao qual se refere. No entanto, a televisão possibilita uma interpretação fragmentada do acontecimento, pois nela não há tempo para uma análise mais cuidadosa, sendo as produções feitas de forma imediata. Já no cinema, essa relação se dá de forma diferente. Nele, é possível retrabalhar os acontecimentos, ir além daquilo que a mídia revela. De acordo com Jean-Louis Comolli (2008): “O cinema não pode suportar por muito tempo a idéia da indiferença, de uma situação e de um ser indiferentes. É por isso que o cinema resiste à lógica mediática” (COMOLLI, 2008: 105). Essa resistência se torna possível através do tempo e da montagem, pois são elementos que permitem ir além da visão dispersa que a televisão dá aos acontecimentos. No cinema as imagens têm maior duração e, por isso, ele permitiria um prolongamento do acontecimento. Com base nas idéias de Comolli isso pode ser percebido como resultado de uma das principais funções do cinema: “Ressoldar os fragmentos. Reconduzir o sentido. Reconstituir a ligação” (COMOLLI, 2008: 101). Entende-se, portanto, que os pontos de vista de um mesmo acontecimento são muito diferentes nesses dois meios. Devido a essa diferença na forma de tratar o acontecimento, faz-se necessário delinear tal conceito. Maurice Mouillaud (1997) afirma que os acontecimentos estão inscritos em uma esfera mediática e, a partir daí, estabelecem uma rede de sentidos de maneira lógica e cronológica. O autor nos diz ainda que o acontecimento é uma “unidade cultural”, compreendida num espaço em que a informação se difunde: “Chamaremos acontecimento a modalidade transparente da informação; aquilo que, então, aparece como figura é seu objeto. Os acontecimentos aos quais se refere a informação formam o mundo que se supõe real” (MOUILLAUD, 1997: 56). A mídia, então, produziria informação acerca de acontecimentos. Porém, em algum momento, essas instâncias se confundem, uma vez que “o acontecimento é inseparável de seu dispositivo de observação” (MOUILLAUD, 1997: 66). No caso dos acontecimentos filmados, a tela – tanto a do cinema quanto a da TV – funciona como sua “superfície refletora”, sendo a diferença a maneira de refleti-los. Em Videogramas o acontecimento em questão é a queda da ditadura na Romênia, enquanto em A revolução é o golpe de estado no governo de Hugo Chávez na Venezuela. No primeiro caso, havia apenas uma emissora de TV, que era estatal e só mostrava o ponto de vista da ditadura. O filme é uma montagem dessas imagens e de muitas outras feitas por cinegrafistas amadores, ampliando a compreensão desse acontecimento, permitindo analisá-lo. No segundo caso, havia uma emissora estatal e outras três privadas que se posicionavam contra o governo Chávez. O filme coloca essas imagens em confronto e permite compreender o embate político que se deu pelas imagens. |
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Bibliografia | COMOLLI, Jean-Louis. Ver e poder. A inocência perdida: cinema, televisão, ficção, documentário. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.
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