ISBN: 978-85-63552-06-8
Título | Cinema entre fronteiras: identidades, trajetos e interculturalidade |
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Autor | Sofia Zanforlin |
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Resumo Expandido | As discussões sobre identidade atualmente já apontam para algumas sínteses: a identidade é construída a partir da diferença, do contato com o outro, (Bakhtin; Simmel; Hall; Bauman); a identidade é movediça e sensível às diversas experiências que o sujeito contemporâneo está atrelado; em tempos de globalização, de fluxos de comunicação, culturas, viagens, trocas, a identidade é constantemente revisada, remodelada, reconstruída e atravessada por diversos matizes, sejam eles de ordem cultural, social, político, de gênero. S. Hall (1998) já dissertou sobre os cinco descentramentos do sujeito responsáveis por relativizar e desestabilizar as noções essencialistas sobre a construção identitária. Trazida para o terreno do temporário e, ao mesmo tempo, negociada a partir da ação individual e a suas relações cada vez mais dispersas e fragmentadas com o social, a identidade se apresenta no dias de hoje como algo extremamente frágil, fluida, cambiante.
Esta comunicação propõe uma discussão em torno da identidade como fronteira, como estado temporário, limiar, entre uma e várias maneiras de estar no mundo e de vivenciar a subjetividade. A fronteira aqui é também no seu sentido geográfico, como marco entre regiões, cidades, países, culturas que, por sua vez, se entrelaçam na própria relação com a construção da identidade. Para ilustrar essa discussão, gostaríamos de trazer dois filmes do diretor alemão de origem turca, Fatih Akin, com ênfase em Do outro lado (2007) e Contra Parede (2004). Os dois filmes se situam entre fronteiras: se passam entre Alemanha e Turquia, entre o pertencimento cidadão e a identificação subjetiva e cultural que costura essas duas realidades, que deságua em sujeitos múltiplos, bilíngües, interculturais e marginais, no sentido do duplo pertencimento, tanto de origem como de herança. Poderíamos citar outros diretores e filmes que trafegam por essa temática: Free Zone (2005), de Amos Gitai; Transylvania (2006), de Tony Gatliff, para citar dois, cuja questão da fronteira, do caminho, e das conseqüências subjetivas dos fluxos, dos encontros e das viagens, transformam definitivamente as concepções de estar no mundo. No caso de Fatih Akin, percorrer fronteiras é um traço peculiar aos dois filmes citados. As viagens entre Alemanha e Turquia, entre Hamburgo e Istambul, são feitas e refeitas, vezes repetidas, pelos motivos diversos. O trânsito compõe o enredo, as paisagens são solicitadas para colorir a história, os idiomas se revezam, numa dança descompassada e reveladora da realidade intercultural contemporânea cada vez mais comum e irrevogável. Essa realidade é compartilhada não apenas entre Alemanha e Turquia, entre França e Romênia, Israel e Palestina, e perpassa já o cotidiano brasileiro, entre El Alto a São Paulo, Kinshasa e Rio de Janeiro, por exemplo. Logo, a fronteira, o limiar, passa a ser considerada um estado de estar no mundo, possibilitada pela viagem, pelo transporte, pelas comunicações. Os fluxos de pessoas, de informação, de dinheiro, de produtos, a mistura dos idiomas, os pluri-pertencimentos, desencadeiam novas formas de construção da identidade e de vivencia da subjetividade: “Que engraçado, um professor turco da Alemanha que acaba numa livraria alemã na Turquia” dispara o alemão, dono da mesma livraria alemã situada em Istambul, para o turco Nejat, professor de alemão interessado na compra do negócio, em “Do Outro Lado”. A graça, portanto, se encontra exatamente na mistura, num encontro onde não é mais possível traçar fronteiras, do que há muito tempo foi considerado essencial: as definições de ser e estar, calcadas em uma noção de identidade estável e localizada. Na contemporaneidade, a fronteira se apresenta como possibilidade de estar e de negociar pertencimentos múltiplos e, fundamentalmente, interculturais. |
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Bibliografia | APPADURAI, Arjun. Dimensões Culturais da Globalização. Lisboa, Editorial Teorema, 2004.
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