ISBN: 978-85-63552-07-5
Título | Da poesia ao cinema: João Cabral, a cidade e a imagem |
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Autor | Tatiana Hora Alves de Lima |
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Resumo Expandido | Nos tempos em que tantas imagens representam a cidade a partir da chave do sensacionalismo midiático, trazendo à tona o medo da violência urbana e a inquietação perante o caos nas metrópoles, e quando os ícones publicitários elaboram e povoam a urbe, qual o lugar do documentário diante das paisagens urbanas? Para Comolli (2008) o documentário teria o papel de construir imagens que estão para além de qualquer marketing, investigando e guardando os mistérios da cidade. E a visão apresentada pelo cinema, segundo Comolli (2008), está mais próxima daquela produzida pelo romancista do que a do arquiteto.
Ou mesmo talvez pudéssemos dizer que a perspectiva do cinema se aproxima daquela da poesia. Assim, nosso problema de pesquisa abrange os documentários Recife de dentro pra fora (1997), de Kátia Mesel, e Recife/Sevilha: João Cabral de Melo Neto (2009), de Bebeto Abrantes, filmes que tem em comum o diálogo com as paisagens urbanas da poesia de João Cabral de Melo Neto. Na esteira da investigação de César Guimarães (2008), consideramos que o estudo do espaço deve transcender a análise dos enquadramentos, procurando também pistas interpretativas na relação entre o espaço, a duração da imagem, e também o corpo e a voz dos personagens filmados, bem como a escuta do cineasta e do espectador. Apesar de Recife de dentro pra fora e Recife/Sevilha serem abordados para construir um panorama do problema, a análise se deterá sobre o documentário Recife/Sevilha e os poemas O cão sem plumas e Sevilha. Ao investigar os afetos do personagem João Cabral e o espaço urbano, não poderíamos ignorar a sua poesia e as maneiras como os filmes buscam dialogar com ela. Recife de dentro pra fora, por exemplo, é conduzido a partir do ponto de vista do rio Capibaribe, assim como ocorre no poema O cão sem plumas. E Recife/Sevilha, ao passar pelo Capibaribe também utiliza este ponto de vista, e ao atravessar as ruas de Sevilha traz imagens de uma câmera que perambula pela cidade ao modo de um flâneur, de que fala Walter Benjamin (2000), e para quem a cidade é uma paisagem inebriante a cada esquina, personagem que inspira a poesia itinerante de João Cabral. Antonio Candido (2004) define o poeta itinerante como aquele que passeia pela cidade e apresenta um romantismo tardio, indo ao encontro do que há nela de urbano e da natureza. Se os habitantes reinventam a cidade através das práticas de espaço, como afirma Michel de Certeau (1998), as figuras de linguagem são tão imprecisas quanto as figuras ambulatórias, trazendo um sentido metafórico em lugar do sentido literal proposto pelo planejamento urbano. Mas, se como afirma Nelson Brissac Peixoto (2004), no contexto do consumo excessivo de imagens a literatura parece ter perdido a capacidade de falar das paisagens, é justamente na literatura que esses filmes buscam uma perspectiva íntima perante as paisagens urbanas. E tomamos para nós o questionamento de Peixoto (2004): será que essas imagens podem conter a duração própria da poesia? Sim, pois é sabido que, como constata Alfredo Bosi (2004), a poesia ocorre na duração, pois o seu significado nos é oferecido através da transfusão de significados promovida pelas metáforas, que constroem assim a imagem-no-poema. E Deleuze (1990) em A imagem-tempo, aborda o cinema de poesia como o cinema em que o tempo transcorre poeticamente, sem estar vinculado ao andamento da narrativa. Tarkovsky (1998) concebe a imagem poética como aquela capaz de exprimir um momento em sua unicidade elevado à infinita potência. Nessa comunicação, propomos analisar melhor as relações entre os dois documentários e a poesia. Nossa hipótese é de que, mesmo proporcionando uma visão mais intimista da cidade, eles estão mais próximos das estéticas videoclípticas e ainda reféns da palavra, não atingindo, no entanto, aquela imagem própria da poesia – a duração e a totalidade que comunicam através do tempo e de um gesto. |
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Bibliografia | BENJAMIN, Walter. Charles Baudelaire: um lírico no auge do capitalismo. São Paulo: Brasiliense, 2000.
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