ISBN: 978-85-63552-07-5
Título | Experiência, narrativa e modernidade nos filmes de família de 1920-30 |
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Autor | Thais Blank |
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Resumo Expandido | O objeto de estudo desse trabalho são “filmes de família” realizados no Brasil entre as décadas de 1920 e 1930, período em que a produção cinematográfica amadora se disseminou pelo mundo.
Enquanto a crítica cinematográfica da época se esforçava para “elevar” o cinema nacional aos padrões hollywoodianos e incentivava a produção de filmes de ficção que evitassem imagens de índios, negros e populares, os “filmes de família”, apesar de narrarem a vida das elites brasileiras, nos mostram a pobreza e as contradições de um país evitado nas telas. Ao registrarem os hábitos e a vida cotidiana, as famílias acabam por dar espaço a personagens invisíveis, empregadas domesticas, trabalhadores do campo, negros filhos de escravos, são alguma das figuras que atravessam essas imagens. Os “filmes de família” vão de encontro à própria linguagem cinematográfica predominante da época. Filmes que prescindem de quase todos os elementos e dos aparatos que garantem a produção de uma imagem “limpa” e estável. Enquanto o cinema americano consolidava as narrativas encadeadas, as histórias guiadas pela “ação-reação”, a construção de um todo através da montagem, esses filmes apresentam narrativas lacunares, fragmentos dispersivos, depósitos de memórias e de afetos que se desenrolam aos tropeços em um tempo galopante. Assim como as fotografias familiares, esses filmes visavam antes de tudo um público doméstico, sua função primordial era a de “eternizar os grandes momentos da vida familiar e reforçar a integração do grupo, reafirmando o sentimento que ele tem de si mesmo e de sua unidade” (SCHAPOCHNIK:1998, 460). Talvez houvesse o desejo de construção de um todo, mas este estava para além das imagens, pois a unidade desses filmes só pode ser reconhecida pelos seus personagens. Em a “Câmara Clara” Roland Barthes fala sobre antigas fotografias de família e observa: “Em relação a muitas dessas fotos, era a História que me separava delas. A História não é simplesmente esse tempo em que não éramos nascidos?” (BARTHES: 2000; 96-97) É justamente nesse espaço, no intervalo que nos separa desses filmes, nesse vazio de significados, que essas imagens se abrem para outros usos. Ao serem depositadas em um arquivo, experiências íntimas passam a guardar não apenas a memória familiar, mas a memória coletiva. Apesar de representarem a vivência de um grupo específico de pessoas, esses filmes possuem um estranho poder de arrebatamento, parecem capazes de atualizar o passado. Fora do domínio familiar, essas imagens se transformam em testemunhas de um tempo que não conhecemos. Imagens que se configuram como um campo de tensões, onde se chocam as forças da modernidade e da tradição. No auge da celebração do moderno, onde as coisas e os homens se tornaram incapazes de contar a sua história, o ato de registrar a vida familiar, os hábitos, os gestos e a afetividade desse grupo, parece ser uma tentativa de resgatar a experiência perdida na modernidade, a “reação de um homem cujos seus vestígios sobre a terra estavam sendo abolidos” (BENJAMIN: 1996; 118). Nessa pesquisa, partimos da idéia de que os “filmes de família” são capazes de nos falar das transformações pelas quais passavam o sujeito moderno, das alterações ocorridas na própria estrutura da experiência, das tensões e as lutas travadas na existência desse novo homem. Acreditamos, que como testemunhos, como imagens que estilhaçam as fronteiras entre o privado e a história, esses filmes podem representar a busca por uma nova narratividade. |
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Bibliografia | BENJAMIN, Walter. Walter Benjamin, obras escolhidas volume 1. Magia e Técnica, Arte e Política. São Paulo: Editora Brasiliense, 1996.
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