ISBN: 978-85-63552-07-5
Título | O Nordeste Armorial em Auto da Compadecida e A Pedra do Reino |
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Autor | Alexandre Figueirôa Ferreira |
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Resumo Expandido | Apesar de algumas mudanças trazidas por produções audiovisuais mais recentes, sobretudo no cinema, no imaginário nacional, o Nordeste brasileiro tem como representações recorrentes duas imagens inconfundíveis. A primeira, a de região seca e pobre, a segunda, a de região detentora de um litoral exuberante e paradisíaco. Coube à literatura, inicialmente, e ao cinema e à televisão mais tarde, extrapolarem as significações primeiras da descrição desta paisagem e fixarem uma percepção idealizada da realidade nordestina.
Este universo tornou-se motivo de inspiração dos artistas preocupados em retratar em suas obras aspectos da cultura popular. Foi deste modo que escritores desbravaram os sertões para relatar a luta do homem sertanejo pela sobrevivência, enfrentando a seca, a injustiça, os coronéis e os cangaceiros. Na ornamentação deste mundo particular eles registraram as histórias dos beatos – que proliferaram pelo sertão afora – e revelaram a herança folclórica ibérica que a região acabou preservando. Estes elementos formam a base de movimentos artísticos concebidos na região como o Regionalismo e o Movimento Armorial. No contexto da cultura nordestina, o Movimento Armorial, idealizado pelo escritor Ariano Suassuna, quebra com a idéia de que as manifestações das culturas populares teriam menor valor que as demais. O movimento teve início no final dos anos 60, em Pernambuco, com o objetivo de realizar uma arte erudita a partir das raízes populares da cultura brasileira. Esta trajetória foi também seguida pelo cinema e pela televisão. Nos anos 60, com o Cinema Novo, quando o cinema brasileiro partiu para um projeto que visava dotar o cinema nacional de uma identidade cultural própria, foi também o Nordeste um dos celeiros de inspiração temática e estética. Eles se apropriaram da iconografia da região, seus personagens, símbolos e mitos, afastando de seus filmes a idéia de um olhar exótico sobre a realidade. Em 1999, o pernambucano Guel Arraes realizou para a TV Globo a microssérie O Auto da Compadecida, baseada na peça mais famosa de Suassuna. Ela foi filmada em película, em Cabaceiras, no sertão da Paraíba e nos estúdios do Projac e da Cinédia, no Rio, e ganhou uma versão cinematográfica de grande sucesso de público. Em 2007, outra obra de Suassuna ganhou uma adaptação para o audiovisual: A Pedra do Reino, de Luiz Fernando Carvalho. A minissérie foi uma co-produção da Globo filmada em 16 mm em Taperoá, na Paraíba, e finalizada em alta definição. Foi um misto de romance de cavalaria e novela picaresca, mostrando que a cultura nordestina e sertaneja tem raízes ibéricas, com elementos da Idade Média, da commedia dell’arte e da cultura árabe. Nestas minisséries não temos mais o Nordeste consagrado em telenovelas e outras minisséries que circunscrevem a região apenas como local do atraso, dos coronéis e da sensualidade desenfreada. É a vez de um Nordeste ibero-barroco capitaneando uma tradição de realização de uma arte erudita a partir das raízes populares da cultura. Contudo, para Guel Arraes, o Nordeste que sobressai de O Auto da Compadecida – com sua hibridização entre o armorial e a cultura de massa – é aquele que dialoga com a cultura popular, realçando, nesta conjugação, a idéia romantizada do homem simples que aponta saídas religiosas, enquanto perpetua no poder uma oligarquia latifundiária decadente, como assinala Durval Muniz Albuquerque em A Invenção do Nordeste. Já a leitura de Luiz Fernando Carvalho aposta justamente em outra direção. Bebendo na mesma fonte do Armorial de Suassuna, o diretor de A Pedra d’O Reino, fiel ao seu modelo de uma teledramaturgia rebuscada, enaltece o Nordeste como berço da tradição brasileira e um passado histórico cuja matriz não é o folclore ou o regionalismo, mas uma ancestralidade que preserva os traços de uma relação com a cultura ibérica. |
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Bibliografia | ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz. A Invenção do Nordeste e outras artes. São Paulo : Cortez, 2001.
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