ISBN: 978-85-63552-07-5
Título | O Avatar de Morel: a quimera do cinema total |
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Autor | Luís Carlos da Costa Nogueira |
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Resumo Expandido | No livro de ficção científica ‘A invenção de Morel’, de 1940, Adolfo Bioy Casares propõe um mecanismo de registo da realidade que, com um grau de perfeição absolutamente utópico (e poucas vezes esta expressão teve tanta propriedade), materializa uma das ideias mais fortes e recorrentes que orientam a evolução tecnológica do cinema: a noção de um cinema total. É uma ideia que podemos encontrar, em diferentes declinações, antes do cinema (em Wagner e na sua obra de arte total) e a propósito deste (em Canudo, e na sua concepção do cinema como arte sintética e convergente; em Eisenstein e na sua noção de cinematismo; em Bazin e no mito do cinema total; no cinema expandido e no cinema experimental). São apenas alguns exemplos. Em tempos recentes, poderíamos acrescentar, como média decisivos para se compreender a perpetuação e vigor desta ideia no imaginário cultural e tecnológico, a Realidade Virtual, essa utopia paradoxal e hoje abandonada, e, mais prosaicos e cada vez mais presentes, os videojogos. Um dos pretextos fundamentais para o estudo que agora apresentamos é referido no título do mesmo. Trata-se do filme Avatar (aqui tomado como sinédoque da tendência recente do cinema 3D), de James Cameron, ao qual é difícil negar o estatuto de marco tecnológico na aplicação da estereoscopia à sétima arte. Mas é um mero pretexto. Em última análise, o que se pretende é fazer uma ponte entre o passado desta ideia de um cinema total e as suas promessas futuras, inventariando e caracterizando diversíssimas obras que por ela são, deliberada ou inadvertidamente, atravessadas – retornando, se necessário, a esse momento primeiro de toda a figuração, a origem cósmica, seja ela plasmada no fiat lux divino ou no big bang científico. Se desconstruímos a ideia de cinema total, verificamos que ela potencia uma multiplicidade de acepções e interpretações, as quais obedecem a um vasto conjunto de princípios: um princípio antropológico de avareza visual, de escopofilia, de desejo de tudo ver, tudo ficcionar, tudo registar, tudo figurar; um princípio teórico, que busca mais a especulação sobre uma possibilidade do que a fabricação de um dispositivo; um princípio tecnológico, de síntese e sinestesia, que no cinema encontrou uma das suas estâncias mais produtivas; um princípio epistemológico, de omnividência ou omniescopia, a vontade de esgotar as múltiplas modalidades da visão; um princípio poiético, que reafirma a cada momento o infindável potencial criativo do cinema, nos seus vários géneros, estilos, tipos. Queremos acreditar que havia cinema antes dele mesmo, e que vai continuar a existir depois e fora dele – essa seria a maior garantia de que um cinema total existe; mas seria uma totalidade incomensurável. Sabemos que mesmo que afinquemos o nosso empenho, a teoria de um cinema total será eventualmente impossível. E isto sem falarmos do seu reverso, do seus espelho ou da sua imbricação inevitável: a teoria total do cinema. E porque sabemos que estas teorias não podem dispensar a teorização das outras artes, o trabalho parece inexaurível. Mas, simultaneamente, irrecusável. Este estudo pretende ser uma espécie de prólogo de uma investigação que procurará compreender a ideia de um cinema total em diversas instâncias e filiações: na ciência, na filosofia, na religião, mas, sobretudo, nas várias artes. Eventualmente, acabaremos na sinestesia como princípio técnico e estético fundamental. Aqui, por agora, analisaremos alguns exemplos de dispositivos que podem servir de ilustração do conceito em questão: as experiências 3D dos anos 50, o Holodeck de Star Trekk, filmes como Matrix, Avalon, Avatar, Inception ou Tron. No fim de contas, talvez estejamos a especular sobre um pós-cinema ou um não-cinema. Não já de duas ou de três, mas de quatro ou cinco ou incontáveis dimensões. |
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Bibliografia | Canudo, Ricciotto, L’Usine aux Images, Arte Editions, 1995 Bazin, André, O que é o Cinema, Livros Horizonte, 1992 Eisenstein, Sergei, A Forma do Filme, Jorge Zahar Editor, 2002 Heim, Michael, Metaphysics of Virtual Reality, Oxford University, 1993 Levinson, Paul, A Arma Suave, Bizancio, 1998 Manovich, Lev, The Language of New Media, MIT Press, 2001 Rieser, Martin (ed.), New Screen Media, British Film Institute, 2002 Ryan, Marie-Laure, Narrative as Virtual Reality, Johns Hopkins University, 2001 Wagner, Richard: A Obra de Arte do Futuro, Antígona, 2003 Shaw, Jeffrey, Weibel, Peter, Future Cinema: The Cinematic Imaginary After Film, MIT Press, 2003 |