ISBN: 978-85-63552-07-5
Título | A Submersão nas imagens sonoras: o som e suas dimensões imaginárias |
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Autor | Damyler Ferreira Cunha |
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Resumo Expandido | Neste texto, discute-se a utilização do ruído fora-de-campo como força expressiva cênica no cinema contemporâneo. Para isso,investigamos as estratégias sonoras composicionais utilizadas em três filmes: Hamaca Paraguaya,filme paraguaio realizado em 2006,pela diretora Paz Encina, e La Cienága,2001 e La Mujer sin Cabeza,2008, realizados pela diretora argentina Lucrecia Martel. Os filmes escolhidos, de certa forma, herdam elementos estéticos de uma primeira fase do cinema moderno,ao mesmo tempo em que incorporam elementos singulares,fazendo com que tais filmes sejam considerados pela crítica como um cinema dito "universal". Mas, quais seriam estes elementos singulares que caracterizam esses filmes como um cinema de caráter universal?
Nestes filmes, seus elementos sonoros característicos promovem uma mudança em sua forma narrativa. Segundo Bernardet (2009:256), a manifestação de um recurso poético,o uso de elipses dentro e entre as cenas,insere ritmo e agilidade nas narrativas. Ele modifica a articulação entre os planos e a composição da unidade espaço-temporal. Nos três filmes,objetos dessa pesquisa, o tempo fílmico encobre a duração real do episódio,o que delonga a temporalidade para ressaltar os aspectos emotivos. A narrativa se desenvolve nas bordas da tela e torna-se uma passagem de estados afetivos,que se repetem em ciclos. A delimitação espaço-temporal representada nos filmes é marcada pela criação sonora. No plano sonoro têm-se o silêncio,a voz,o som ambiente,os ruídos,e a música utilizada para criação de uma paisagem sonora a partir do princípio de não-redundância entre o visual e o sonoro. A imagem enquadrada é habitada por vozes sem corpo na tela, que podem ou não entrar em campo na passagem do espaço off para in(CHION,2003:223). A elipse seria importante para a compreensão do movimento da narrativa em fluxo crescente,o que nos leva a acompanhar mais as emoções que os acontecimentos da história. A criação sonora prioriza um espaço fora-de-campo que configuram as histórias nas bordas da narrativa. A modulação dos ruídos e sua inserção na cena como sons abruptos geram no espectador uma expectativa de algum estado novo que não é revelado pela imagem mostrada, existe uma incongruência entre o que é visto e o que é ouvido na tela. A invisibilidade dos sons cria uma ambigüidade,um espaço de transbordamento da subjetividade entre a tela e os olhos do espectador. Seriam então, um cinema universal que reflete uma estética derivada de um olhar imerso no mundo, e não mais diante dele? Ao narrar uma história, não falamos somente de fatos, mas também de impactos emocionais. Logo,o espectador tem que lidar com uma atmosfera criada sobre aquilo que não é explicado ou visto. Resta saber,como sentimos ou percebemos aquilo que é invisível. E como distinguir, na experiência perceptiva de um filme, uma camada de impressões. Merleau-Ponty,em "Estrutura do Comportamento" dispõe que “as percepções de fato,dirigem-se às relações e não a termos absolutos”(PONTY,1975:142). Aproximando-se,fenomenologicamente,do teórico francês Pierre Schaeffer,que constrói o conceito de objeto sonoro como base para a música concreta, em Tratado de los objetos musicales,distinguem-se, quatro tipos de escuta:o ouir, o écouter, o enténdre e o compréendre,como acepções lexicografadas do verbo enténdre, uma derivação semântica do significado etimológico no francês “ter a intenção”. Ao conceber a escuta como entendimento,Michel Chion(2003:221),toma o som como objeto de observação e o examina como elemento da representação no cinema vinculada à construção do espaço cênico. Nos filmes analisados,o deslocamento dos sons à um espaço fora-de-campo revela aquilo que está indeterminado pela imagem. Ao suscitar diferentes possibilidades de sensações, o som seria o elemento que delimita o espaço mesmo sem sabermos o que há exatamente nele. Então, prestar atenção seria realizar um contraponto entre som e imagem a fim de delimitar uma presença acusmática no cinema. |
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Bibliografia | AUMONT, Jacques. O Olhar Interminável [cinema e pintura]. São Paulo: Cosac e Naif, 2004.
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