ISBN: 978-85-63552-07-5
Título | O guru e os guris, de Jairo Ferreira |
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Autor | Renato Pannacci |
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Resumo Expandido | A comunicação se inicia com uma breve apresentação da figura de Jairo Ferreira e a contextualização do período em que realizou sua obra escrita e audiovisual. A relação com o Cinema Marginal; os anos como crítico de cinema no jornal da colônia japonesa São Paulo Shimbun, acompanhando boa parte das produções da Boca do Lixo; os filmes que realizou, espécies de filmes-diário, quase todos caseiros e rodados em Super-8; o período como crítico da Folha de São Paulo; o livro Cinema de invenção; e o conceito de “invenção”, criado por Ezra Pound e transposto do âmbito da literatura para o do cinema por Ferreira. Entre os anos de 1973 e 1980, Jairo Ferreira realizou cinco curtas, um média, e dois longas metragens. O primeiro destes foi O guru e os guris, filme de doze minutos produzido em 1973. Rodado em 35mm e com uma equipe profissional de cinema, se difere de sua filmografia seguinte justamente por essas características: seus outros filmes são quase todos captados em Super-8, artesanais, diários cinematográficos onde a vida do autor se mistura com as próprias obras. Documentário encenado, O guru e os guris partiu de roteiro previamente escrito por Jairo, sendo viabilizado por Carlos Reichembach, que o produziu, fotografou, e cedeu a estrutura de sua então produtora de cinema publicitário, a Jota Filmes. Esse esquema de produção tradicional, com roteiro, equipe, captação em 35mm só foi retomado por Jairo em Nem verdade nem mentira, ficção de 1980. O guru e os guris retrata a figura do pioneiro cineclubista Maurice Legeard, mítico fundador e coordenador do Clube de Cinema de Santos. Imagens escrachadas do que seria o dia-a-dia de Legeard: perambulando pelas ruas de Santos, pesquisando arquivos sobre cinema brasileiro e os mostrando para um cachorro, praguejando dentro de uma sala de cinema onde crianças assistem uma produção da Disney, manejando um projetor de cinema e películas em chamas; se somam à narração over do próprio Legeard, um tanto desordenada e em tom de desabafo, discorrendo sobre a falta de interesse dos brasileiros com o cinema feito por aqui, a superestima dos cineastas estrangeiros, as agruras da atividade cineclubista. A edição de som polifônica e a música cômica, agregadas aos planos-sequência e câmera caótica, tentam dar conta da linguagem experimental/de invenção que o autor sempre defendeu em seus escritos e filmes. Ferreira se apropria da figura ranzinza – mas que desperta simpatia – de Legeard, para tecer comentários sobre a situação do cinema brasileiro, o descaso que não mudou muito daquela época para os dias de hoje. Frases de impacto são ouvidas na voz de Legeard, como “Na mesma época em que foi fundado o Clube de Cinema de Santos, foi fundada a Cinemateca Francesa. Hoje a Cinemateca Francesa tem quatro ou cinco mil filmes, e nós estamos aqui de chapéu na mão”; e “Piada de cinema no Brasil é o seguinte ... que o Brasil vai produzir, por ano, cem filmes. Sabe quantos desses filmes chegam ao público brasileiro? Dez ou quinze.” Opiniões como essas sempre se fizeram presentes no pensar/cinema de Jairo. O final do curta, nesse sentido, é emblemático. Após uma longa e exaltada discussão, sobre cinema brasileiro, do guru Legeard com seus guris, em uma mesa de bar, ouve-se a risada de Zé do Caixão. É o início do samba-enredo Castelo dos horrores, entoado pelo próprio Zé: “Eu moro no castelo dos horrores, não tenho medo de assombração, ôôô eu sou o Zé do Caixão. Na tela a imagem de arquivo de um filme B, onde um homem morto, dentro de um caixão, se transforma em uma caveira. É a caveira do próprio cinema brasileiro. Legeard respirava cinema, assim como Jairo Ferreira, para quem o cinema e a vida eram indissociáveis. O cinema como alimento para a vida – a antropofagia de Oswald de Andrade –, perspectiva que permeia toda a obra de Jairo, e que aflui violentamente em seu filme mais discutido, O Vampiro da cinemateca, longa-metragem de 1977, onde o autor/personagem decreta: “Chupo filmes para renovar meu sangue”. |
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Bibliografia | - FERREIRA, Jairo. Cinema de invenção. São Paulo: Limiar, 2000. - GAMO, Alessandro (org.). Críticas de Jairo Ferreira - Críticas de invenção: os anos do São Paulo Shimbun. São Paulo: Imprensa Oficial, 2006. - GAMO, Alessandro. Vozes da Boca. Campinas, SP: Tese de doutorado, IA/Unicamp, 2006. - GAMO, Alessandro. A crítica de Jairo Ferreira no São Paulo Shimbun. In: Cadernos da Pós-Graduação – Ano 9, Volume 9. Campinas, SP: IA/Unicamp, 2007. - POUND, Ezra. ABC da literatura. São Paulo: Cultrix, 1995. - PUPPO, Eugênio; HADDAD, Vera (org.). “Cinema Marginal e suas fronteiras”. Catálogo. São Paulo: CCBB, 2001. |