ISBN: 978-85-63552-07-5
Título | Desmontando monumentos: apropriação, imagens de arquivo e documentário |
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Autor | Luiz Augusto Coimbra de Rezende Filho |
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Resumo Expandido | Essa comunicação retoma a discussão sobre a “crítica dos documentos” empreendida pela História Nova e pela Arqueologia de Foucault, buscando relações entre essa perspectiva e a apropriação de documentos audiovisuais em práticas artísticas contemporâneas. Nos anos 1960, foi Foucault quem identificou uma revolução na maneira de pensar o documento. O historiador e filósofo reflete sobre as noções de documento e de monumento, materiais da memória coletiva e da história, e faz uma afirmação que se tornou célebre: a história é o que, hoje, transforma os documentos em monumentos.
Certos argumentos desenvolvidos por Foucault nos parecem úteis para pensarmos o uso do documento e certas questões que envolvem esse uso na arte contemporânea e no documentário. Classicamente, o documentário tem afinidades com o documento na sua acepção mais tradicional. Muitas críticas feitas ao documentário até hoje se baseiam nessa relação, como se o documentário, desde sempre e para sempre, almejasse as mesmas características e funções do documento em sua compreensão tradicional: expressar a verdade, representar o real. A revelação do conjunto de operações que o documento demanda para “ser historicizado”, e que podemos entender como o que Foucault denomina “crítica do documento”, é a investida da história numa compreensão do documento não mais como algo que “representa” uma segunda coisa, e que por isso deve ser interpretado e determinado como algo a que cabe de maneira fundamental a indagação sobre sua autenticidade. O documento passa a ser pensado como o que precisa ser trabalhado segundo um campo de relações estabelecido pela própria história e como o que estabelece sentidos e valores diferentes de acordo com a perspectiva que o insere neste campo de relações. Jacques Le Goff (1990) retoma essa discussão em uma perspectiva muito similar à de Foucault. Para o autor, o método seguido pelos historiadores sofreu uma mudança. Não se trata mais de fazer uma seleção dos vestígios, traços e monumentos, mas sim de considerar todo documento como um monumento, ou seja, de colocá-los em série e inseri-los nos conjuntos formados por outros monumentos, de trazer à luz as suas condições de produção e de mostrar em que medida todo documento é instrumento de um poder. Fica então estabelecido um novo estatuto e relevância para os arquivos documentais, além de uma nova concepção de documento histórico, tomado em si mesmo como objeto de análise e não como objeto inocente e transparente da escrita da história. A derradeira transformação da noção de documento na contemporaneidade passa pela constatação daquilo que o faz transformar-se em monumento: a sua utilização pelo poder. O documento é monumento porque resulta de um esforço das sociedades que o guardaram e manipularam. Passa, além disso, pelo entendimento segundo o qual documento e monumento são um par indissociável. O documento/monumento aparece, assim, como o resultado de uma montagem não só da época e da sociedade que o produziram, mas também das diversas épocas sucessivas durante as quais ele continuou a existir e a ser manipulado. A crítica dos documentos/monumentos é, em certa medida, a sua desmontagem, uma desestruturação desta construção, já que eles são marcados por uma intencionalidade, sobre a qual não cabe, em última instância, um julgamento sobre o que nela é verdadeiro ou falso. É um gesto análogo ao que os historiadores fazem ao empreender a crítica dos documentos que encontramos em cineastas como Chris Marker, Harun Farocki e Sergio Bianchi. Estes cineastas operam o que acima denominamos “desmontagem” das imagens de arquivo ao se apropriarem de documentos audiovisuais produzidos a uma distância histórica que já os havia preenchido de sentido e valor. Esta comunicação apresentará, em sua conclusão, breves análises sobre como estes realizadores empreendem cinematograficamente uma “crítica dos documentos” que utilizam. |
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Bibliografia | COMOLLI, J-L. “Mauvaises Frequentations”, in Images documentaires, numero 63, Regard sur les archives. Paris: 2008.
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