ISBN: 978-85-63552-07-5
Título | O apocalipse presentificado em Der Leone have sept cabeças |
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Autor | Glauber Brito Matos Lacerda |
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Resumo Expandido | Der Leone have sept cabeças (O Leão de Sete Cabeças, Congo Brazzaville 1970) foi o primeiro filme de Glauber Rocha realizado no exterior, e traz o colonialismo, em todas as suas formas (social, econômico, político, cultural), como tema central. Apesar de ter sido rodado na África, as discussões suscitadas pelo filme seriam para todo terceiro mundo. Para atender a uma proposta educativa nomeada pelo autor de “épico-didático arquetípico” (Gardner, p. 2, 2010), os personagens são tipos constituídos a partir de elementos reconhecíveis no universo político dos anos de 1970 e, de uma maneira não menos metafórica, no Apocalipse de São João. Marlene (interpretada por Rada Rassimov), uma loira sedutora, é o imperialismo; Pablo (Gulio Brogi), um revolucionário latino americano; Zumbi (Baiack), o negro revolucionário; Xobu (André Segolo), o político africano corrupto; o mercenário alemão (René Koldhoffer); o comerciante português (Hugo Carvana); o agente americano (Gabrielle Tinti) e o padre (Jean Pierre Léaud), representando o cristianismo desacreditado e surge como um personagem que liga os demais entre si numa atmosfera apocalíptica, como explica Glauber Rocha, em entrevista para Elizabeth Cardoso:
Todos os personagens (...) são as bestas de Apocalipse que são projetadas por esse padre para quem o cristianismo já está completamente falido, está perdido dentro do misticismo africano, e que anuncia todas essas bestas. Essas bestas são, às vezes, trágicas, às vezes, cômicas, se cruzam nesse universo provocando uma série de situações que são todas demonstrativas da colonização e da luta contra a colonização. O apocalipse glauberiano é presentificado. Está prenhe de referências estéticas e políticas que marcam a trajetória social do artista. É válido ressaltar que o cineasta é oriundo de uma família protestante batista. Concomitantemente, seu cinema é marcado por um engajamento, próprio da geração do cinema novo, que pensava no filme como meio de politização das massas. Em “Der Leone have sept cabeças” a insurreição do povo do terceiro mundo triunfa diante do imperialismo. Portanto, muito mais do que expor a problemática do colonialismo, o diretor a coloca numa perspectiva escatológica, em que há uma afinidade eletiva entre um possível futuro glorioso do povo colonizado e as escrituras proféticas de João Evangelista presente na própria formação do diretor, como ele mesmo esclarece: “uma vez que me considero protestante de formação e africano de educação alimentar, preferi inspirar-me no Apocalipse de São João” (Rocha apud Valentinetti, p. 124, 2002). Para compreender como Glauber Rocha atualiza as profecias apocalípticas em seu filme, faremos uma abordagem principiada na sociologia configuracional de Norbert Elias, a fim de apreender como as redes sociais em que o artista esteve inserido lhe propiciaram o resultado estético presente no filme, na medida em que ele incorpora as influências de sua formação religiosa, política e artística. Escolhemos Elias, tendo em vista os seus estudos empíricos sobre como a subjetividade expressada em obras de arte está relacionada com o contexto social do artista. Assim, o faz em “A peregrinação de Watteau à ilha do Amor”, quando analisa a tela do século XVIII “O embarque para ilha de Citera”, de Antoine Watteau”. Valeremo-nos também dos estudos de Auerbach sobre a literatura cristã para tentar compreender como o cineasta se apropria dessa matriz e a traduz em imagens. É importante frisar que tal processo antropofágico, conforme o próprio Glauber Rocha (Valentinetti, p. 125, 2002) explicita nos seus comentários sobre o filme, está ancorado em três autores que pensam a arte revolucionária: Brecht, Eisenstein e Godard, os quais são utilizados na construção da ferramenta metodológica em questão. |
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Bibliografia | AUERBACH, Erich. Mimesis: A representação da realidade na literatura ocidental. Perspectiva: São Paulo, 2007.
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