ISBN: 978-85-63552-07-5
Título | Recortes cômicos: quando imagens reposicionam poder e política |
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Autor | Maria Teresa Ferreira Bastos |
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Resumo Expandido | Resistência, poder, política, imagem. Como fazer circular essas questões a partir do trabalho de pesquisa em acervo fotográfico? Como o método de pesquisa pode refletir e repercutir um determinado pensamento? O objetivo desta comunicação é trazer uma reflexão final após três anos de pesquisa de pós-doutorado com o tema “Fotografia e comunismo, imagens da polícia política no acervo do Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro”.
Instigada pela proposição do simpósio de pensar o método e a resistência, a intenção do trabalho é, à luz do pensamento de Georges Didi-Huberman, trazer a público o álbum político-cômico encontrado recentemente no acervo fotográfico do Fundo Polícia Política, do Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro. Este objeto, sem identificação e sem uma história preexistente que permita sua identificação, provocou em mim, como pesquisadora, o gesto de torná-lo um “laboratório” do processo de pensar a imagem, suas metodologias de abordagem, suas possibilidades de pesquisa, lançando mão da relação da fotografia com a colagem e a montagem, com os arquivos e com o tempo. O álbum, antigo, provavelmente montado nos anos 50 e 60, é constituído por 20 páginas de papel cinza cartonado, com colagens de recorte de fotografias oriundas de jornais e revistas da época na frente e no verso da página. Com corte preciso e caprichoso, estampa em suas páginas rostos de políticos importantes do período, como Jânio Quadros, Fidel Castro, João Goulart, JK, Nikita Khrushchev, entre outros, colados em corpos de mulheres, crianças e bebês, estratégia que resulta num olhar cômico, divertido, grotesco e irônico. Mas, além da história que certamente essas imagens narram e que as atrela a uma temporalidade específica, a um “tempo”, a contribuição da montagem em si nos permite, como forma de resistência do gesto de pesquisador, despregá-las desse tempo. A condição atual do álbum, ainda sem registro e história, ou seja, sem algo que o identifique, aguça a imaginação, a dedução e evidencia o olhar anacrônico ao qual Didi-Huberman se refere e que tem sido o processo de trabalho da pesquisa. Um local de resistência em forma de pastiche, que envolve o poder. O desconhecimento, o fato do objeto ter sido “descoberto” no imenso acervo constituído por cerca de 50 mil imagens. A montagem do álbum como resistência ao tempo e o gesto da montagem das imagens como ato de coleção. O uso do humor, da ironia, do cinismo. O próprio objeto como resistência. Em Quand les images prennent position, o historiador da arte francês, Georges Didi-Huberman salienta que para saber é preciso tomar posição e enfatiza que não há nada de simples num tal gesto, uma vez que toda posição é, fatalmente, relativa e exige que nos situemos no tempo; se estamos no presente, visar o futuro, lembrando que, no fundo, existe uma temporalidade que nos precede, nos conclama à memória justamente nas tentativas do esquecimento, de ruptura, de embarcar na novidade absoluta. Para saber, é preciso saber onde se situa nosso “não saber”, nossos medos latentes, nossos desejos inconscientes. “Para saber, é preciso então, contar com duas resistências ao menos, duas significações de resistência: aquela que dá conta de nossa vontade filosófica ou política de romper as barreiras de oposição (é a resistência que diz não a isso, sim àquilo) mas igualmente aquela que dá conta de nossa propensão física à erigir outras barreiras no acesso sempre perigoso no sentido profundo de nosso desejo de saber (é a resistência que não sabe mais muito bem ao que ela consente e nem a que ela quer renunciar). |
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Bibliografia | AGAMBEN, Giorgio. “O Autor como gesto”. In: Profanações. São Paulo: Boitempo, 2007.
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