ISBN: 978-85-63552-07-5
Título | Estética e política do corpo no cinema: o devir nômade em Karim Aïnouz |
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Autor | Geisa Rodrigues |
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Resumo Expandido | Neste artigo proponho uma reflexão sobre a relação entre as escolhas estéticas e a dimensão política no cinema contemporâneo. Por meio da análise de três longas do diretor Karim Aïnoz: Madame Satã (2002), O Céu de Suely (2006) e Viajo porque preciso, volto porque te amo (Co-direção com Marcelo Gomes, 2009), procuro revelar de que forma os recursos expressivos do cinema podem funcionar a serviço de um pensar político produtivo no cinema brasileiro. Dado o imbricado processo que envolve as subjetividades contemporâneas, os lugares de resistência vinculados a um coletivo para a oposição a práticas repressoras definidas perderam sua potência. Dessa forma, para uma reflexão sobre as possíveis formas de resistência no cinema é importante articular as perspectivas teóricas e críticas sobre a lógica atual de poder com a análise dos recursos estilísticos e expressivos empregados. Neste sentido, algumas noções pontuais, a partir do trabalho de Foucault, Deleuze e Guattari se destacam, não apenas pela proposição crítica de novos formatos de poder, mas pela pressuposição de “linhas de fuga” e de experiências de resistência. Entre elas a visão do campo social como um espaço constantemente percorrido pelo desejo, e ao mesmo tempo capaz de ser subvertido e reinventado pelo desejo. Isso sugere que as estratégias e lugares de intervenção criativa, que inserem novas e mutantes possibilidades de experimentação, poderiam redefinir os territórios tradicionais de referência, que perderiam seu caráter fixo e definitivo. Singularidades manifestas no interior da própria concepção de biopolítica e de suas atualizações pós-disciplinares.
No campo do audiovisual, como resultado dessas transformações, nota-se uma valorização da experiência estética do corpo no espaço e no tempo. Alguns exemplos bem sucedidos no cinema contemporâneo, ou pelo menos aclamados pela crítica como tal, apontam para a potência de uma estética que, além de romper com formatos narrativos, problematiza a representação, privilegiando a experiência sensorial. Tal cinema parece se pautar especificamente num novo paradigma estético, proposto por Guattari, que surge nas últimas décadas, para lidarmos com o “agenciamento desterritorializado” contemporâneo, em que a potência estética de sentir, ou seja, o campo dos perceptos e afetos ganha uma posição privilegiada com relação aos agenciamentos coletivos de enunciação, mas ao mesmo tempo também poderá se constituir como foco de resistência (GUATTARI,1998, p. 132-134). Entretanto, sabemos que mesmo as “existências criativas” correm sempre o risco de serem agenciadas, na lógica do controle que se exerce em todas as partes do capitalismo tardio. A experiência estética do cinema é bastante suscetível a ser transformada em mercadoria esvaziada de sua materialidade política. E muitas vezes a própria necessidade de experimentar com o corpo surge como limite à inventividade. No contexto atual, para um pensar político efetivo no cinema, é preciso trabalhar formas expressivas capazes de instaurar um devir nômade para os personagens e situações, sem se dissolver numa estetização apática. Ou seja, não sucumbir à hipervalorização do particular e do sensorial, que em si já revela uma oposição dicotômica, entre individual e coletivo. Como estabelecer formas produtivas de resistência, num momento de estímulo à mobilidade e à multiplicidade identitárias, ou seja, quando a fuga à norma passou a ser a norma? Como agenciar o controle e, mesmo correndo o risco de por ele ser agenciado, estabelecer novos pontos de fuga? Sem a pretensão de elucidar tais questões, mas de problematizá-las, neste trabalho pretendo investigar os desafios de um cinema que precisa, cada vez mais, negociar com a imposição atual por formas fluidas e indefinidas de figuração, sem abandonar de vez a materialidade discursiva do corpo. |
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Bibliografia | AÏNOUZ, Karim. A política do corpo e o corpo político – o cinema de Karim Aïnouz. Revista Cinética, Rio de Janeiro, 2007. Entrevista. Disponível em: http://www.revistacinetica.com.br/cep/karin_ainouz.htm.
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