ISBN: 978-85-63552-07-5
Título | Estéticas realistas contemporâneas: a trilogia de Gus Van Sant |
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Autor | Denise Camillo Duarte |
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Resumo Expandido | A trilogia da juventude norte-americana de Gus Van Sant, composta por Elephant (2003), Last Days (2005) e Paranoid Park (2007), traduz-se em exemplo de um realismo cinematográfico contemporâneo que atualiza técnicas do passado. Em suas recriações do real, a filmografia enfoca de maneira singular aspectos sociais que atingem especialmente os Estados Unidos, parecendo não encontrar eco em nenhuma outra expressão cinematográfica local. Relações entre violência (assassinato ou suicídio), gênero (homossexualidade) e juventude norte-americana (solidão, desesperança, apatia e desencanto nas relações do jovem com o mundo) são temáticas recorrentes na trilogia. Elephant é o duplo da tragédia americana em Columbine, Last days reconstitui os últimos instantes de vida do músico Kurt Cobain e Paranoid park, que sem traduzir-se em reinvenção de um caso real de repercussão midiática como o foram os filmes antecessores, mantém a mesma aura, não somente ao inserir imagens reais à trama ficcional. A violência recriada nos remete ao pensamento de Gilles Deleuze sobre o cinema de ação: “há personagens que estão numa certa situação, e que agem, caso necessário com muita violência, conforme o que percebem” (DELEUZE, 1992, p. 68). Assume o próprio Van Sant sua proximidade com o Cinema Verdade de Jean Rouch e Edgar Morin (CAVAGNA, 2008). Porém, identifica-se ainda a influência, entre outros, do Neo-Realismo Italiano, não somente em relação à temática social, uma das especificidades do movimento (BAZIN, 1991), como ainda em aspectos relativos a uma dramaturgia baseada em naturalismo, teatralidade e montagem, donde se extrai a força dramática do realismo impresso nas imagens ficcionais. A questão suicida, recorrente em Germania anno zero (1948) e Europa ’51 (1952), de Roberto Rossellini, igualmente se faz presente em Elephant e em Last days. Se realismo e temática definem o estilo de Van Sant, três aspectos permitem sua aplicação à trama: o uso da câmera, o uso do espaço fílmico e a mise en scène. O uso da câmera dá-se, não raro, em longos planos-sequência. Os planos abertos dentro ou fora da escola, em Elephant, nos remetem ao tempo real dos acontecimentos e nos permitem vivenciar o que teria sido o dia da tragédia. Por meio do plano de perambulação, o plano pelas costas, seguimos os personagens como testemunhas oculares, onde “a personagem tornou-se uma espécie de espectador” (DELEUZE, 2005, p. 11). O plano-seqüência também possibilita efeito de continuidade de espaço e tempo, dentro de uma narrativa que, em geral, é entrecortada por inversões de pontos de vista que pontuam quebras narrativas. Quanto a aspectos da mise en scène, Van Sant privilegia o uso de jovens atores não profissionais, preparados para uma atuação naturalista, na busca do efeito de real. No tocante à ação, observa-se o que Bazin denomina de um cinema de duração, verdadeiramente realista quanto ao tempo. Não há exacerbação na ação. Verificam-se, em muitos casos, tempos estendidos, com poucos cortes, de modo similar, ainda, a Michelangelo Antonioni, principalmente à sequência final de L'eclisse (1962). Assim, Van Sant se utiliza de tempos estendidos para extrair maior realismo de suas ficções. Em Last days vêem-se longas cenas corriqueiras, “uma espantosa exploração dos tempos mortos da banalidade cotidiana” (DELEUZE, 2005, p. 14). Se realismo em cinema é, desde sempre, um conceito complexo, o pensamento de Jacques Aumont sobre a dificuldade de se indicar vertentes realistas na área (AUMONT, 2003) permite-nos intuir três instâncias interligadas e, ao mesmo tempo isentas de fronteiras ou especificidades: a busca do real, o lúdico e o ficcional. Aplicando-se, afinal, a matriz proposta por Bernardet (BERNARDET, 1994) é possível inferir aspectos comuns à trilogia (e também a Mala Noche (1995), principalmente Gerry (2002) e Milk (2008)), assentada em paradigmas realistas contemporâneos para a imagem. |
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Bibliografia | AUMONT, Jacques; MARIE, Michel. As teorias dos cineastas. Campinas, SP: Papirus, 2004.
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