ISBN: 978-85-63552-07-5
Título | Uma representação de loucura no cinema brasileiro |
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Autor | Maria Noemi de Araujo |
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Resumo Expandido | Como uma noção de loucura é representado no cinema brasileiro contemporâneo? A partir da noção lacaniana de loucura como "singular, particular ou originalidade" pode-se estudar o personagem de “Policarpo Quaresma: Herói do Brasil” (Paulo Thiago, 1988, adaptação do livro de Lima Barreto de 1911) que não aceita as explicações do médico sobre o que é "normal". Policarpo se recusar a participar de uma sociedade conformada com atitudes afirmativas de fixar padrões no cotidiano, onde impera a repetição e a normalidade... Assim, ele vai buscar renovação pela via da sabedoria, da pesquisa e da ciência. A convivência de Policarpo com a loucura no sentido clássico (doença mental) se dá com a sua internação no manicômio, após redigir um documento oficial na língua tupi.
Inspirado no poema "Dois loucos" de Paulo Leminsk, o documentário “Dizem que sou louco...” (Chnaiderman,1994) retrata a vida de "doentes mentais" de rua da capital paulista. A psicanalista e cineasta Chnaiderman mostra algo de singular em cada um dos seus personagens portadores ditos "loucos de rua". Persiste no tempo a noção de que “todas as famílias felizes se parecem; cada família infeliz é infeliz à sua maneira”. Atribuída a Tolstoi, esta frase inspirou o dito poético atribuído a Picasso, “de perto nenhuma pessoa é normal”, traduzida por Caetano como “de perto ninguém é normal” e documentado por Coutinho em Edifício Máster. Segundo Coutinho, este filme mostra que “de perto todo mundo é normal, bastou abrir as portas deste edifício para se ver que todo mundo delira!”. No filme, Coutinho explora esse aspecto em cada personagem. Em “Santiago”, João Salles, atualiza esta noção de loucura associada à “família feliz” partindo da representação de um dos aspectos da sua história de família. Nesta obra, Salles produziu um gesto que retificou algo de um laço social desmanchado que inclui o Santiago, o mordomo aposentado da casa. Isso aparece no filme instante em que o “personagem” inventa uma espécie de “fracasso” no discurso do filme. No decorrer de uma de suas entrevistas concedida ao cineasta Salles, num tom meio de súplica, Santiago pede ao entrevistador para dizer algo particular (fora do combinado), sugerindo tratar-se de alguma revelação acerca da sua sexualidade... Salles o interrompe, corta sua palavra... Na montagem, o cineasta se apropria desse ato de “corte” (ou censura) usando-o na construção do discurso do filme como um elemento novo. Isto produz um efeito de “furo” na medida em desrregula o discurso filme.O cineasta deixou escapulir algo da sua loucura ao incluir essa sequencia no filme.. Ao se deixarem ser vistos, de tão perto, Salles e Santiago se tornaram personagens de uma “feliz” reinvenção, que fez desta a mais louca obra deste cineasta, no sentido lacaniano no termo. Ou como diria Gorostiza, “cada um com sua própria, singular e incomparável loucura” dividiu a crítica. Os seus precursores documentaram algo da loucura particular de uma geração que sofreu cortes “reais” da censura do regime militar. O baiano ator de seu próprio filme, Edgar Navarro, se inclui na loucura da própria cena delirante de seu filme “Super Outro”. Trata-se de uma alegoria do delírio vestido de “super homem” perambulando pela capital baiana correndo a pé, ou a cavalo... Já o pernambucano Jomard Muniz, também ator de seu próprio filme, encarcerou a loucura do personagem de “Palhaço degolado” numa “Casa de Detenção da Cultura”. A noção de loucura presente nestas obras se aproxima da idéia de arte como “tudo que está naquele nada” (Tolstoi, 1898) e como algo que “sublima o dejeto". Segundo Miller, o surrealismo transformava sucata em arte e sublimá-la seria "sublimar o dejeto". Assim, para se compreender o modo destes cineastas fazerem laço social através do cinema, é preciso pensar na singularidade da sua produção de "dejetos", de discurso (verbal e cênico) sobre a ética da loucura( (Lacan, Seminário 7, Ética). |
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Bibliografia | Aumont, J.À quoi pensent les films, Paris : Séguier, 1996.
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