ISBN: 978-85-63552-11-2
Título | A construção da “voz” nos documentários observativos Justiça e Juízo |
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Autor | Bertrand de Souza Lira |
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Resumo Expandido | A realização de um documentário é um processo que passa pela organização e tratamento de sons e imagens que um realizador lança mão para comunicar ao expectador determinados aspectos de uma determinada realidade. A “voz” de um documentário é o resultado do uso dos recursos os mais diversos visando a expressão de uma visão particular sobre o mundo histórico. A essas estratégias diferenciadas de abordagem do real, Nichols (2005) chama de “voz”. A “voz” diz respeito também à palavra falada dos personagens, mas seu significado vai mais além, abrangendo também todo o arsenal de recursos expressivos proporcionados pelo audiovisual no registro e na expressão de um pensamento a respeito do real.
Nossa proposta pretende abordar a construção dessa “voz” num dos seis modos de representação do real, identificados por Nichols, na produção de um documentário, Neste caso, escolhemos o modo observativo, tendo como objeto de análise os documentários Justiça e Juízo (Maria Augusta Ramos, 2004 e 2007). Nos modos de representação ou modos de abordagem do real elencados por Nichols, figuram, além do modo observativo, os modos expositivo, poético, participativo, reflexivo e performático. A “voz” identificada na realização de um documentário pode ser a perspectiva do diretor ou da instituição patrocinadora. É um conjunto de “ênfases e consequências” que constituem uma forma dominante de organizar um documentário revelando de forma sutil ou mais explícita a articulação de um argumento que expõe uma forma de ver um determinado aspecto do mundo histórico. O documentário observativo propõe uma observação espontânea da experiência vivida, abrindo mão do controle hegemônico exercido noutros modos de representação do real, a exemplo dos modos expositivo e poético. É como se o que está na tela é “o que teria acontecido se a câmera não estivesse ali para observar”. No entanto, por trás dessa “observação espontânea”, premissa básica que norteia o documentário observativo, há uma série de procedimentos deliberadamente adotados pelo realizador na construção do seu ponto de vista sobre o mundo histórico que vai da escolha do tema e dos fragmentos da realidade a serem registrados pela câmera à seleção e ordenação desse material na montagem, sem contar com a performance dos personagens diante da câmera. Nos filmes em questão, a câmera observa o cotidiano de adultos e menores infratores enredados com a justiça, acompanhando audiências em tribunais do Rio de Janeiro que envolvem acusados, familiares, juízes, defensores públicos e promotores. Não é a câmera que vai provocar essas audiências, mas é certo que sua presença vai interferir na atitude e comportamento dos personagens retratados contribuindo para exacerbar o teatro social estabelecido. Esses documentários, estruturados sob o modo observativo do mundo histórico, recusam a voz de autoridade (voz-over), as reconstituições históricas, ações repetidas para a câmera, efeitos sonoros adicionais, legendas e até mesmo as entrevistas. Vamos procurar identificar nesse aparente distanciamento e neutralidade com o objeto filmado nos documentários Justiça e Juízo de que forma se dá a construção de uma perspectiva singular do realizador, com a escolha de técnicas “cinemáticas e estilísticas” no tratamento das imagens e sons captados do real, que tenta nos fazer aderir a essa visão de mundo e seus valores através do produto fílmico apresentado. |
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Bibliografia | DAHIN, Sílvio (2004). Espelho partido: tradição e transformação do documentário. Rio de Janeiro: Azougue Editorial.
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