ISBN: 978-85-63552-11-2
Título | Das proliferações de caminhos em filmes menores: diálogos anacrônicos |
|
Autor | Érico Oliveira de Araújo Lima |
|
Resumo Expandido | Em Estrada para Ythaca (2010), filme dirigido pelos irmãos Luiz e Ricardo Pretti e pelos primos Guto Parente e Pedro Diógenes, há uma encruzilhada. Dois caminhos para o cinema são apontados, numa maneira de pôr-se em jogo com o passado, mergulhar numa temporalidade que remonta à cena de Glauber Rocha no filme de Godard e Gorin, Ventos do leste (1970). O cinema pode se bifurcar, pode pensar caminhos, fazer passagens. Mas de que natureza são esses traçados que se abrem, ontem e hoje? Como eles se tocam, se pensamos a dimensão mesma do tempo como matéria sensível posta em jogo pelas imagens? Aqui seria possível propor encontros entre posturas fílmicas, maneiras de estar, fazer, sentir, ver e ouvir.
Pensemos nos engajamentos do presente, numa relação anacrônica com operações sensíveis do passado, dentro de uma proposta movimentada por Didi-Huberman (2000). Que diriam, então, o momento citado de Ventos do leste e as imagens produzidas pelo próprio Glauber para a produção de cenas em Estrada para Ythaca e para o filme seguinte dos irmãos Pretti e dos primos Parente, Os monstros (2011)? Mais ainda, para inserir a questão numa rede, que diriam os acontecimentos estéticos-políticos suscitados por filmes de Glauber para os modos de sensibilidade na produção recente? Uma produção que pode ser pensada pela via trazida por Ikeda e Lima (2011), que propõem um inventário afetivo de um cinema de garagem. E podemos compor também com a noção de um cinema pós-industrial, posta em debate por Migliorin (2011). Tento acrescentar a essas possibilidades de discussão a noção de filmes menores, maneiras de se pôr em um devir-menor, a partir daquilo que discutem Deleuze e Guattari (2003), ao tratarem da literatura de Kafka ou ainda quando Deleuze (2010) discute o teatro de Carmelo Bene. Dentro dessa perspectiva, não se trataria de pensar como as obras buscam alcançar uma legitimidade ou uma suposta inclusão dentro de configurações majoritárias. A possibilidade de devir-menor pode colocar em cena justo um processo que não se instala em formas fixas, mas prolifera caminhos, abre fissuras e se espalha sensivelmente pelo mundo. Essa entrada na discussão é desencadeada pela materialidade das imagens de dois filmes de Glauber em especial: Câncer (1968-1972) e Di Cavalcanti (1977), obras precárias, alegres e movimentadas pelo desejo. Trata-se de buscar caminhos, a partir do que diz Glauber a respeito de Câncer: “O caminho do cinema são todos os caminhos” (ROCHA, 2004). Os filmes menores reverberam em variabilidade contínua, são um turbilhão que desmontam as ordenações postas previamente. Isso demanda ser contemporâneo dessas imagens, para poder formular, também, como elas nos são contemporâneas. Agamben (2009) nos coloca o problema do contemporâneo também como dimensão anacrônica, uma fuga a cronologias e a um sentido único do tempo, a uma teleologia. Trata-se, então, menos de um cinema do passado e um cinema do presente que de cinemas que se bifurcam no tempo, se torcem e retorcem. A política e a estética seriam questões de como fazemos pontes nas temporalidades, de quais traçados são arrancados como possíveis. Ou de como os engajamentos podem instaurar resistências pequenas e precárias. Que encruzilhadas se multiplicam, então, nos cruzamentos de tempos? Como Glauber movimenta e reverbera? A citação feita por Estrada para Ythaca faz vibrar movimentos improváveis em torno da multiplicidade das resistências e dos engajamentos. Não se trata de buscar filiações entre duas gerações, mas de ver como os caminhos do cinema se multiplicam: o cinema como possibilidade para a invenção, no gesto de liberdade que rejeita os esquemas e se abre à dimensão do menor. Um cinema intensivo que pulsa na materialidade, operada na contaminação com o mundo e na alegria de estar com amigos. |
|
Bibliografia | AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo? e outros ensaios. Chapecó, SC: Argos, 2009.
|