ISBN: 978-85-63552-11-2
Título | Autoria, descoberta do ‘eu’ e música pop nos filmes de Jia Zhang-ke |
|
Autor | Cecília Antakly de Mello |
|
Resumo Expandido | A comunicação proposta é dedicada à relação intermidiática entre o cinema e a música pop nos filmes Xiao Wu (1997), Plataforma (Zhantai, 2000) e Prazeres Desconhecidos (Ren xiao yao, 2002), do diretor chinês Jia Zhang-ke. Um dos principais diretores do cinema mundial contemporâneo, Jia é considerado o principal nome da Sexta Geração do cinema chinês, também conhecida como a ‘geração urbana’ por seu enfoque na vida e na paisagem das cidades do país. A hipótese a ser explorada é de que a inclusão de canções pop nos primeiros três longas-metragens do diretor, realizados em sua província natal Shanxi, manifesta-se como uma marca autoral complexa relacionada à emergência e valorização do indivíduo no panorama de mudanças econômicas e sociais da China continental. Partindo da premissa de que a intermidialidade no cinema de Jia Zhang-ke não se opõe ao seu entendimento como cinema de autor, sugiro que o uso extensivo da música pop, principalmente de origem taiwanesa, deva ser investigado como algo mais do que uma inserção incidental nos filmes supracitados. As diversas canções que pontuam sua obra são em um primeiro momento fragmentos de sua memória individual e autoral, transformadas em peças importantes no seu empenho de reconstrução de uma memória coletiva através do cinema. Porém, e para além de seu valor memorial, o impacto dessas canções taiwanesas nos anos 1980 e 1990 na China continental se deve, em grande medida, ao emprego da enunciação em primeira pessoa (como por exemplo “eu te amo” ou “eu estou sofrendo”). O uso do “eu” enunciador na música era até então algo inédito para alguém como Jia Zhang-ke, nascido em plena Revolução Cultural (1966-76), período em que o valor do “indivíduo” parecia sumariamente sufocado. Com o fim da Revolução Cultural e o início da Era das Reformas, a sociedade chinesa passou aos poucos a recuperar o sentido do “eu” e a importância de pensamentos e idéias individuais. Assim, o cinema autoral de Jia participa desse processo principalmente através de seu uso da canção pop em mandarim, advinda da “província rebelde” de Taiwan. As canções aparecem nos filmes de modo diegético (com destaque para as cenas em karaokês) e não-diegético, e com mais força ainda na boca dos personagens. Essas observações acerca da redescoberta do “eu” levam também a um questionamento obrigatório da noção de autoria no contexto específico da China contemporânea. A despeito das reformas econômicas implantadas, é certo que subsistem tensões e desequilíbrios entre o coletivo e o individual sob o regime ditatorial do Partido Comunista. A atividade artística continua a sofrer forte pressão da censura e deve se arriscar na clandestinidade se quiser buscar alguma liberdade de expressão. Os autores da “quinta geração”, por exemplo, parecem ter sido absorvidos pelo governo, ou vivem hoje no ostracismo. Qual seria então a validade de se pensar a figura do autor na China? |
|
Bibliografia | De Baecque, Antoine (org.). La politique des auteurs: Les textes – IV. Petite anthologie des Cahiers du Cinéma. Paris: Cahiers du Cinéma, 2001.
|