ISBN: 978-85-63552-11-2
Título | Promíscuo e desviante: o masculino nos clipes Relax e Filthy/Gorgeous |
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Autor | RODRIGO RIBEIRO BARRETO |
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Resumo Expandido | Os videoclipes vêm se mostrando um terreno de alargamento da representação do corpo de homens e da erotização a eles direcionada. Indo de encontro a habituais esquemas audiovisuais, personae e personagens masculinos ocuparam precocemente nos clipes a posição de objeto sexual tradicionalmente reservada às mulheres. Parece ser possível reputar tal flexibilização do olhar voltado para homens à confluência de fatores como: escolhas temáticas; estilo de performance apresentado; vínculo de agentes videoclípicos (diretores, artistas musicais, performers convidados) a identidades e orientações sexuais “alternativas”, além da expectativa de que tal arejamento genérico-sexual encontraria um público ávido. O trabalho propõe-se a analisar essa interseção de fatores textuais e contextuais geradores de instâncias de masculinidade que – ao se desviarem da norma – trazem novas possibilidades afetivas e identificatórias. Não raro a masculinidade desviante é apresentada através de situações videoclípicas de promiscuidade sexual: obras ambientadas em festas, orgias ou clubes de iniciação, buscando associar um sentido libertador e utópico a esse investimento erótico. Em Relax (Bernard Rose/Frankie Goes to Hollywood, 1983) e Filthy/Gorgeous (John Cameron Mitchell/Scissor Sisters, 2005), são trabalhados justamente aqueles elementos que Alberoni associou à realização orgiástica: o acolhimento de um grupo com diversas disposições de desejo e aparência física; o ambiente propício apartado do cotidiano e a atmosfera de partilha, em que o exemplo de um participante estimula a inserção do ainda não inserido. Além dos temas-tabu, tais obras enfatizam sua atratividade através da construção francamente artificiosa da expressão musical, coreográfica ou dramática. Tudo isso com a participação integral dos membros das bandas, aos quais não podem ser reputados interesses puramente apelativos ou mercadológicos. Nesse sentido, será relevante avaliar a incidência da homossexualidade assumida por muitos dos integrantes das duas bandas consideradas (e pelo diretor de um dos clipes). É possível adiantar que – ao se colocarem abertamente no contexto produtivo – tais artistas parecem mais predispostos a desafiar a heteronormatividade das representações videoclípicas, inclusive permitindo-se posicionar em inusitados graus (em se tratando de homens) de objetificação e exibição corporal. Uma abordagem da trajetória desses artistas permitirá identificar a relação de seu projeto criador com vinculações identitárias decorrentes de sua orientação sexual e sociabilidade, o que passa inclusive pela cena musical de onde surgiram. A influência da filiação e pertencimento a grupos particulares sobre escolhas e estratégias internas das obras foi observada por Carlson ao tratar do vínculo de certos tipos de arte performática com as formas identitárias assumidas, rearranjadas ou negadas pelos seus realizadores. As principais personae ou funções eróticas dos clipes são assumidas pelos vocalistas, que ocupam papéis de destaque como neófitos ou iniciados, como dirigentes ou cicerones. Alguns desses protagonistas estão plenamente colocados em posição de objeto do desejo; outros têm objetificação mais sutil. Varia ainda entre eles o grau de exposição corporal. Contudo, como fluidez erótica é a tônica da promiscuidade, tais posições não são estanques, derivando também da interação com os coadjuvantes. Nesse último grupo, representantes andróginos, transgêneros ou drag trazem elementos adicionais para a discussão sobre a masculinidade, uma vez que complexificam convencionais divisões genéricas binárias. Tal exibição diversificada de corpos atende, como diria Jeudy, a uma pedagogia de perda de inibições, cujas consequências são: a consecução de formas renovadas e não exaustivas de representação do masculino e o desencadeamento de efeitos (sensoriais, emocionais e comunicacionais) inclusivos do desejo de uma parcela de espectadores raramente contemplada em produtos massivos audiovisuais. |
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Bibliografia | ALBERONI, Francesco. Promiscuidade. In: O erotismo – fantasias e realidades do amor e da sedução. São Paulo: Círculo do Livro, 1988, p. 85-110.
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