ISBN: 978-85-63552-11-2
Título | CineNava - o cinema na memória de Pedro Nava |
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Autor | Carlos Roberto de Souza |
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Resumo Expandido | “Acomodado na minha carteira, pronto para saborear como se estivesse num cinema” é a imagem que Pedro Nava utiliza para descrever a emoção e a expectativa com que aguardava o início de sua primeira aula no colégio Pedro II, no Rio de Janeiro. A passagem está em Balão cativo, segundo volume das memórias de Nava, e o ano era 1916.
O entremostrar-se da figura no intrincado tecido narrativo das memórias do autor não é esporádico. Nos seis volumes das memórias, acrescidos da publicação dos originais do sétimo, deixado incompleto, encontramos 198 ocorrências relativas a cinema, na seguinte ordem: em Baú de ossos, 21; em Balão cativo, 30; em Chão de ferro, 31; em Beira-mar, 65; em Galo-das-trevas, novamente 31; em O Círio perfeito, 19; e em Cera das almas, 1. Vale lembrar que as memórias de Pedro Nava cobrem da infância ao início da idade adulta do narrador, quando começa a clinicar no Rio de Janeiro, no começo da década de 1930. Geograficamente centradas nessa cidade, em Juiz de Fora, onde nasceu, e em Belo Horizonte, onde passou a juventude e se formou em Medicina, as anotações cinematográficas de Nava abarcam, portanto, a era do cinema silencioso até a chegada do cinema sonoro no Brasil. A proposta desta comunicação é sistematizar a reflexão sobre as anotações de Pedro Nava relativas a cinema. Mesmo a um leitor menos minucioso fica evidente nessas memórias o fascínio de seu autor pela figura de Charles Chaplin, cujos filmes Pedro Nava perseguiu desde 1916. A figura quase obsedante ressalta em termos de comparação (um tipo popular de Juiz de Fora descrito em Baú de ossos como uma antevisão de Carlito ainda antes do surgimento da personagem), na entronização de Luzes da cidade (City lights, 1931) entre as maiores obras de arte produzidas em todos os tempos (O Círio perfeito), no pôster de Chaplin que o narrador tem como companheiro em suas noites insones (Galo-das-trevas). Mas esse é apenas o aspecto mais evidente daquelas anotações. A uma leitura mais atenta começa a emergir a extraordinária importância que o ritual cinematográfico tinha para as gerações das décadas de 1910 a 1930, na vida social, cultural e econômica (um notável exemplo da última é a equivalência estabelecida entre o preço das entradas do cine Velo, na Tijuca, com o de carteiras de cigarros, passagens de bondes e catecismos de sacanagem, em Chão de ferro). Os cinemas enquanto lugares arquitetônicos, geográficos e espirituais desfilam ao longo das memórias, desde o Farol, primeiro cinema de Juiz de Fora e de Pedro Nava, as várias salas cariocas – com destaque para o Íris, o Ideal e o Velo, mas não apenas –, e as de Belo Horizonte, onde o Odeon se destaca sobranceiro como ponto de encontro de amigos, namoradas e de ramos da Tradicional Família Mineira em seus vários e imóveis estratos. Há descrições pormenorizadas de edifícios, decoração e espetáculos, filmes, orquestras, acompanhamentos e números de palco. O despertar sexual da adolescência tem como um de seus componentes, além dos catecismos, os filmes pornográficos das sessões do Cinema Alegre, onde um austero professor do Pedro II é surpreendido no intervalo de projeção entre dois rolos de um “filme de bandalheira” (Balão cativo). Há pitadas de erotismo nas páginas dedicadas aos seriados e às divas italianas, mas também o princípio de um prazer estético que se enriqueceria com o passar dos anos. As reflexões dedicadas à importância do cinema para a constituição de um novo sistema de usos e costumes sociais, morais e mentais atingem o ápice de significados quando um bando de rapazes e moças vai assistir Broadway melody (MGM, Harry Beaumont, 1929), primeiro filme 100% falado, cantado e dançado exibido no Avenida de Belo Horizonte (Galo-das-trevas). Além da sistematização das referências cinematográficas nas memórias de Pedro Nava, a comunicação se deterá brevemente no que significa esse tipo de documento para os estudos do cinema no Brasil. |
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Bibliografia | Cardoso, Marília Rothier; Vasconcelos, Eliane [org.]. Pedro Nava, O Alquimista da Memória. Rio de Janeiro: Fundação Casa de Rui Barbosa, 2003 [catálogo da exposição].
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