ISBN: 978-85-63552-11-2
Título | Cinema de gênero ou cinema de autor? Um olhar sobre Wong Kar-wai |
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Autor | Ludmila Moreira Macedo de Carvalho |
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Resumo Expandido | Se nos estudos literários o gênero constitui um conceito fundamental, na teoria do cinema ele é frequentemente visto como um mero conjunto de convenções pré-estabelecidas associadas exclusivamente ao cinema dito comercial, de maneira que críticos em geral não veem a necessidade de estudar o conceito de maneira aprofundada. Essa concepção de gênero como uma fórmula que restringe possibilidades autorais pode ser considerada limitada em diversos aspectos. Em primeiro lugar, ela ignora o poder do cinema de gênero como um “poderoso meio ideológico” (Comolli; Narboni 1993), onde gêneros são definidos e por sua vez definem hábitos culturais das audiências.
Em segundo lugar, esta perspectiva não dá conta da complexa relação entre estilo autoral e gênero na obra de alguns cineastas contemporâneos, como é o caso, por exemplo, do cineasta oriundo de Hong Kong Wong Kar-wai. Consagrado em festivais internacionais e celebrado como um dos cineastas mais criativos do cinema mundial contemporâneo, Wong não teve problemas para conquistar o cobiçado status de autor apesar de sua ainda jovem obra, graças sobretudo a um estilo marcado pela combinação entre experimentação visual e narrativa fragmentada. Pareceria incongruente, portanto, localizar uma obra fortemente estilizada e individual no seio de uma cinematografia tão marcadamente genérica e comercial como a de Hong Kong, onde filmes são produzidos de maneira rápida, em larga escala, visando mercados internacionais, obedecendo à lógica do star system hollywoodiano e dependente de gêneros (para muita gente, ainda hoje o cinema de Hong Kong é sinônimo de kung fu, ainda que o gênero tenha sofrido inúmeras alterações desde a época de Bruce Lee até os dias atuais). No entanto, a obra wongiana é uma típica cria do cinema de Hong Kong: dos orçamentos altos, passando pelo uso de astros e estrelas do entretenimento local, até a relação com gêneros locais e hollywoodianos. O que este trabalho pretende demonstrar é que o estilo autoral de Wong Kar-wai não existe a despeito das fortes convenções genéricas do cinema de Hong Kong, mas justamente por causa delas. Para isso, propõe-se realizar uma análise de seus filmes de longa-metragem considerando as complexas relações que cada um deles estabelece com um ou mais gêneros cinematográficos: As Tears Go By (1988) e os filmes de gângster (tríades) de Hong Kong, Dias Selvagens (1991) e os filmes de juventude rebelde dos anos 50/60, Ashes of Time (1994) e os filmes de artes marciais (wuxia), Amores Expressos (1994) e os filmes de ação policial e comédia romântica, Anjos Caídos (1995) e o film noir, Felizes Juntos (1997) e os road-movies e filmes queer, Amor à Flor da Pele (2000) e o melodrama, 2046 (2004) e os filmes de ficção científica, Beijos Roubados (2007) e os road-movies. Em todos os seus filmes, Wong parte de algumas das convenções genéricas mais familiares para desconstruí-las ou subverte-las, embora nunca de maneira paródica ou radical, manipulando os horizontes de expectativas das audiências em direção ao que pode ser descrito como seu estilo particular de lidar com tais gêneros. Através destas análises pretende-se demonstrar, portanto, que o caráter autoral e o caráter genérico do cinema de Wong Kar-wai não são características mutuamente excludentes – pelo contrário, defendemos que o caráter genérico da obra wongiana, longe de ser limitadora, é o que nos permite compreender sua obra dentro do complexo sistema que é o cinema de Hong Kong. Em outras palavras, considerar a relação de Wong Kar-wai com o cinema de gênero é fundamental para a compreensão de seu estilo, o que pode nos levar a um maior entendimento tanto da obra particular deste autor quanto de outros autores que negociam com um ou mais gêneros cinematográficos. |
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Bibliografia | ABBAS, Ackbar. Hong Kong: culture and the politics of disappearance. Minneapolis: University of Minnesota Press, 1997.
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