ISBN: 978-85-63552-11-2
Título | Comentários sobre o som na obra de Éric Rohmer |
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Autor | MARINA CASTILHO TAKAMI |
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Resumo Expandido | Analista e amante do cinema alemão dos anos 1920, Éric Rohmer chegou a autointitular-se como um cineasta do cinema mudo. Trata-se de uma provocação, nada inocente, uma vez que os seus dois primeiros ciclos de filmes - Contos Morais e Comédias e Provérbios –, por exemplo, caracterizam-se pela presença marcante da palavra falada e bem articulada. Ao mesmo tempo, para afastar uma possível contradição, Rohmer destacava nos filmes do período silencioso a presença da palavra, que não se escuta mas que é representada gráfica e gestualmente na tela. Se o texto e as palavras possuem um lugar especial na obra do cineasta, não é diferente em relação à música.
Autor de uma obra fílmica plena de citações diretas e indiretas a outras formas de arte, Rohmer, ao defender o estatuto artístico do cinema em seu polêmico ensaio Celluloïd et le marbre (1955), o compara à música, situando esta última em um plano mais elevado, mais nobre, que o da pintura, da poesia e do romance, também tratados no texto. Na mesma época realiza o curta-metragem, hoje desaparecido, Sonate à Kreutzer, inspirado na obra homônima de Léon Tolstói, cujo título faz referência à famosa sonata de Beethoven. Não por acaso seu primeiro longa-metragem, O Signo do Leão (1959), que tem como protagonista um violinista, chega a citar numa mesma sequência a ópera wagneriana, o período romântico e a música moderna de Béla Bartók. Em 1964 Rohmer realiza o curta Place de l’étoile, parte do filme “Paris visto por...”, apresentando-o como uma espécie de manifesto anti-música de filme. Melômano, o cineasta escreveu nos anos 1980 o ensaio De Mozart em Beethoven e uma peça de teatro chamada Trio en mi bémol baseada no trio em mi bemol de Mozart. Apesar de não ter uma formação musical sistemática, Rohmer compôs pequenas músicas para seus filmes em colaboração com a sua montadora, Mary Stephen, sob o pseudônimo de Sébastien Erms. O cineasta atribuía uma grande importância à música, mas não via, no geral, muito espaço para ela em seus filmes. Ele justifica essa ausência dizendo que não cabe música de filme onde há fala ou sons da natureza. Também afirmava preferir os ruídos do ambiente como música a música de filme propriamente dita. A partir de 1969, uma vez que a tecnologia permitia, Rohmer adotou definitivamente o registro do som direto como parte de seu processo de criação mantendo-se sempre atento às novas possibilidades técnicas. A partir do filme A mulher do aviador (1981), ele adota o uso frequente de pequenos microfones de lapela em filmagens externas. Seguidor assumido do pensamento de André Bazin, o trabalho de som de Rohmer é um dos elementos de ancoragem do seu cinema à realidade de uma determinada época e de um determinado lugar. Ainda que o “som real” possa ser contestado enquanto verdade, o cineasta buscava a autenticidade também pelo som, quase como um documentarista, o que não impede a estilização, quando necessária, e um grande trabalho de pós produção do material sonoro bruto. O som muitas vezes definia a escolha dos lugares de filmagem. Neste estudo considera-se como som: música, vozes e ruídos, sendo o silêncio um elemento necessariamente contido no que chamamos de sonoro. Apresenta-se alguns casos específicos do trabalho sonoro na filmografia de Rohmer enfatizando sua produção a partir dos anos 1980, como, por exemplo, Os amores de Astrée e de Céladon (2007), uma adaptação de um conto de Honoré d'Urfé, do qual podemos destacar a presença da música diegética e da locução over e a alteração digital da voz do protagonista pela equipe do IRCAM (Instituto de Pesquisa e Coordenação de Música e Acústica). Este estudo nutre-se de conversas da autora com o engenheiro de som Pascal Ribier, que colaborou com Rohmer entre 1987 e 2006. |
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Bibliografia | ALTMAN, Rick. Film sound, film practice. New York, London: Routledge, 1992.
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