ISBN: 978-85-63552-11-2
Título | Reemprego de imagens e redes – a montagem que desata e noda conexões |
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Autor | Luiz Garcia Vieira Junior |
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Resumo Expandido | O reemprego de imagens na atual produção audiovisual, seja qual for sua maneira de circulação (cinema, televisão, internet, galerias de arte, etc.), ratifica a problematização acerca das formas de suas manipulações dessas imagens. Em suas múltiplas manifestações, constata-se graus diferenciados do reuso de material proveniente de várias origens e suportes na produção de novas subjetividades. Sendo filmes que se constituem necessariamente através da operação de montagem, o trabalho de reposicionamento dos elementos coletados, e conforme as diferentes graduações operadas expõem confrontações e disputas deflagradas pela quebra de uma lógica interna primeira dessas imagens. Ao mesmo tempo, esse gesto político e estético, ao irromper novas associações por montagem, permite prospectar conexões em rede dos constitutivos desse material, sejam relacionadas às subjetividades, à sua elaboração formal ou modo de produção. Pensar essas imagens, aproveitando Bruno Latour, como “uma vasta rede onde não circulam signos, não matérias, e sim matéria tornando-se signos” (Latour, 2005).
No cinema, do experimental ao documentário, ou em inusitadas combinações de “ficção”, encontramos filmes particulares que em sua totalidade (ou quase) são elaborados exclusivamente por imagens de terceiros. Essas realizações nos servem como objetos de estudo que, potencialmente, multiplicam-se em vetores, um instrumental reflexivo do social poderoso. Gilles Deleuze afirma que "as máquinas são sociais antes de serem técnicas" (Deleuze, 2005). Percebendo o cinema como uma máquina social, e ampliando as implicações que podemos perceber quando da utilização do acervo desse ecossistema de imagens, também podemos questionar de que maneira então essa filmografia pode revelar e afetar este social, aproximando-se ainda da noção proposta por Latour, o social como o que “não designa uma coisa entre outras coisas, [...], mas um tipo de conexão entre coisas” (Latour, 2005). Portanto, entendemos que esta filmografia elaborada a partir de materiais “estrangeiros”, montados a partir de uma nova perspectiva, expõem inscrições passíveis de rastreamentos para entendimentos sobre a máquina-cinema e seus desdobramentos. A operação da montagem nesses filmes adquire um caráter laboratorial, percebendo a maneira da manipulação de sua matéria-prima que serve como ponto de partida, meio e fim da realização. Ultrapassa a acepção “clássica” de montagem, e nos sugere seu entendimento ampliado, no sentido que ela “monta” essa rede de significações diferenciada do material colhido através da reflexão sobre as próprias imagens, de uma desconexão para uma conexão de outra ordem. O que é explicitado ou sugerido, “do visível e do invisível” (Rancière, 2005), este segmento de filmes volta-se para essas imagens com o “poder de associação e dissociação”, e ao mesmo tempo, na “emancipação de cada um de nós como espectador” (Rancière, 2009), seu viés político. Filmes formalmente distantes como Pacific (2009) de Marcelo Pedroso e Coming attractions (2010) de Peter Tscherkassky, são exemplos. No primeiro, a ressignificação dos registros performáticos de turistas em um cruzeiro construiu um documentário que extrapola, “pela excessiva visibilidade” de seus passageiros, como aponta André Brasil (Brasil, 2011), a leitura primária de seus contornos e o modo de produção dessas imagens. No segundo, um filme found footage, onde o realizador mescla imagens do cinema de Pasolini com imagens publicitárias para daí estabelecer correlações com a noção do cinema de atrações de Tom Gunning (Tscherkassky, 2010). São os efeitos da montagem no cinema, como aponta Georges Didi-Huberman, “trata-se de pôr o múltiplo em movimento, nada isolar, fazer emergir hiatos e analogias, indeterminações e sobredeterminações à obra” (Didi-Huberman, 2003) [ou ao material reempregado], que aproximam esses filmes e revelam a tessitura de conexões. |
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Bibliografia | BRASIL, André Guimarães. Pacific: o navio, a dobra do filme. Revista Devires, v.7, n2, 2011.
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