ISBN: 978-85-63552-11-2
Título | Embalando a história e a memória no rastro de O Louco |
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Autor | denise tavares da silva |
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Resumo Expandido | Boa parte dos documentários biográficos no Brasil e América Latina ainda se constrói apoiados na estratégia clássica de biografar, ou seja, atendo-se a um relato linear que quase sempre inicia na infância e prossegue apresentando a vida como uma sucessão de acontecimentos lógicos, na base de causas e efeitos – como critica, radicalmente, Bourdieu (2006). No entanto, é possível destacarmos uma gama de propostas que rompem com tal fórmula. São filmes que investem em experimentações da linguagem e buscam fabular narrativas que inquietem o espectador, evitando asserções que não deixem frestas para leituras prismáticas. Nesta clivagem, algumas das propostas mais bem sucedidas valem-se das ricas possibilidades abertas pelo uso de imagens e sons de arquivos.
Mas não se trata, novamente, de uma garimpagem focada exclusivamente na personalidade biografada. O que ocorre é um alargamento do foco que traz para dentro do filme os personagens do entorno, ou aqueles descobertos pelas novas leituras do tempo passado. Este, apresenta-se agora redesenhado por reverberações provocadas pela intensidade com que se busca compreender o que, inicialmente, parecia apenas o ponto de partida e de chegada. Um ponto cada vez mais múltiplo graças à ideia de que “um” sempre é “muitos” e não se ater a este fato é navegar, outra vez, nas águas lineares da biografia clássica. Um exemplo brasileiro da nova estratégia é O homem que engarrafava nuvens (2009), de Lírio Ferreira, sobre Humberto Teixeira, o letrista parceiro de Luiz Gonzaga, chamado o rei do baião. Mas há um desafio que persiste quando o biografado é de outros tempos, antes desta abundância de imagens e sons, paraíso de diretores cinéfilos, como é Lírio Ferreira. Foi o que enfrentou Belén Orsini, documentarista venezuelana, para fazer O Louco, biografia de Simón Rodriguez, que nasceu em Caracas (Venezuela), em 28 de outubro de 1769 e morreu em San Nicolás de Amotape, povoado peruano, em 17 de julho de 1853. No intervalo da sua vida, Rodriguez acumulou, entre outras histórias, o feito de ter sido professor de Simón Bolívar, o libertador. Sua importância em vida, segundo registros da história, foi razoavelmente abalada após a morte do antigo aluno o que, para muitos, explica o seu leito de morte bastante solitário, estando acompanhado apenas de Camilo Gomez, amigo de seu filho José e sem um lugar fixo para morar. Tinha 83 anos e, em vez de lecionar, como fez na maior parte da sua vida, dedicava-se a fabricar velas. A proposta deste texto, recorte de pesquisa sobre documentário biográfico na América Latina, é discutir como a diretora representa este personagem. Como fabula sua escrita do passado? Que marcas ou importância seu biografado ganha estando na televisão, mídia que, segundo Sorlin, “permanece largamente ignorada” (2009, p.41), pelos historiadores? Como representa este indivíduo, assinalando os deslocamentos e fraturas que a ideia de identidade sofreu a partir do século XX? É possível, em um produto para TV, tecer novas estratégias narrativas e experimentos de linguagem, de modo que não se trate, apenas, de evocação histórica? |
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Bibliografia | BOURDIEU, Pierre. A ilusão biográfica. In: FERREIRA, M.M.; AMADO, J. Usos & abusos da história oral. 8ª ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 2006.
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