ISBN: 978-85-63552-14-3
Título | Estudos da voz e cinema contemporâneo |
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Autor | Fernando Morais da Costa |
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Resumo Expandido | No artigo Soundscapes: towards a sounded anthropology, os antropólogos e musicólogos Samuels, Meintjies, Ochoa e Porcello comentam o que lhes parece ser um esquecimento da própria voz como objeto dos estudos de som na antropologia, em detrimento, por exemplo, da música produzida pelos grupos sociais estudados (SAMUELS et al, 2010). Tendemos a achar que o mesmo ocorre no cinema, o que constitui um paradoxo, se pensarmos na centralidade da voz para o cinema sonoro desde seus primórdios até o cinema comercial contemporâneo. Podemos também pensar que a análise da voz como feita dentro do âmbito da teoria cinematográfica costuma recair sobre a questão espacial, como é o caso em Michel Chion, ou seja, da localização das vozes no filme dentro ou fora de quadro, dentro ou fora da diegese, e dificilmente ultrapassa os limites de uma análise semântica, ou, para usar outro conceito já conhecido da obra de Chion, de uma escuta semântica dos filmes.
Evidentemente, sobre voz no cinema, é bibliografia básica o primeiro dos numerosos livros que Chion escreveria a partir dos anos 80 acerca do som cinematográfico. Em La voix au cinema se encontram os conceitos, já bem conhecidos dos estudos de som no cinema, que dizem respeito a um cinema vococêntrico, cuja narrativa seria centrada na voz em suas variadas manifestações, ou ao acusmatismo, neologismo em francês já traduzido para o português que descreve os sons fora de quadro, as manifestações sonoras das quais não vemos a fonte. (CHION, 1999). Texto também bastante conhecido é A voz no cinema: a articulação de corpo e espaço, artigo de Mary Ann Doane que consta da coletânea A experiência do cinema, organizada por Ismail Xavier (DOANE, 1991). Ali, a ancoragem da voz no corpo visualizado ou não na imagem é explicada a partir da influência da psicanálise sobre a teoria cinematográfica nos anos 70, época da produção do texto. Estudos mais recentes comentam a prevalência da voz do narrador em narrativas cinematográficas contemporâneas. Exemplo disso é o artigo de Cleber Eduardo, Eu é um outro – variações da narração em primeira pessoa, sobre a variedade de usos da voz do narrador no cinema brasileiro recente, e sua provocativa hipótese de que, em determinados casos, essa voz desloca o discurso do diretor par a fala do personagem que narra, tirando a responsabilidade sobre as falas dos ombros de quem as concebeu. (EDUARDO, 2005). Da Argentina vem o estudo de Ivan Morales sobre determinado cineasta local, Mariano Llinás, em cujos filmes se pode perceber a centralidade da voz de um narrador: Mariano Llinás e a presença exacerbada da voz do narrador (MORALES, 2012). Evidentemente, estudos sobre a voz advindos de outras áreas do conhecimento devem enriquecer e dar subsidio a análise da voz no cinema. Uma abordagem da voz profundamente interdisciplinar encontra-se na obra de Mladen Dollar: A voice and nothing more. Dolar analisa fenômenos vocais a partir de abordagens linguísticas, físicas, metafísicas, éticas, psicanalíticas, políticas. (DOLAR, 2006) Nome inescapável sobre oralidade é o suíço Paul Zumthor, bastante conhecido nos campos de estudos das letras e da comunicação, seja por um estudo como A letra e a voz, acerca da multiplicidade de relações entre palavra falada e escrita na Idade Média europeia (ZUMTHOR, 1993), seja pelas entrevistas do autor sobre as mais diversas manifestações da voz, essa “coisa” para usar o seu próprio bem-humorado termo, central para a experiência de uma sociedade humana. (ZUMTHOR, 2005) Nossa pergunta é: como analisar a pluralidade de papeis da voz no cinema contemporâneo levando em conta não apenas o conteúdo semântico do que é dito, mas também a materialidade da voz, os sotaques, as cadências, os ritmos, as relações com as pausas entremeadas às palavras e quaisquer demais componentes da fala, entendendo como o conjunto desses componentes acrescenta sentido aos filmes? |
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Bibliografia | CHION, Michel. The voice in cinema. New York: Columbia University Press, 1999.
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