ISBN: 978-85-63552-14-3
Título | Argentina-Brasil: surtos experimentais clandestinos nos anos 1970 |
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Autor | Estevão de Pinho Garcia |
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Resumo Expandido | A presente comunicação objetiva realizar um estudo comparativo entre a produtora brasileira Belair filmes e a argentina CAM. Ambas se constituem como projetos autorais coletivos e fundamentados na afinidade e amizade existente entre os seus sócios. Em cada uma das duas produtoras, encontramos três: os diretores Rogério Sganzerla e Julio Bressane e a atriz Helena Ignes, na brasileira; e os diretores Edgardo Cozarinsky, Miguel Bejo e Julio César Ludueña, na argentina. As duas “empresas” produziram uma significativa quantidade de filmes em um período bastante curto e tiveram vida efêmera. A Belair rodou entre janeiro e março de 1970 os longas A família do barulho, Cuidado madame, Barão Olavo, o horrível (todos de Bressane), Carnaval na lama, Copacabana mon amour, Sem essa aranha (todos de Sganzerla) e um filme não finalizado em super 8 chamado A miss e o dinossauro. A CAM, por sua vez, finalizou ao longo de 1971 os filmes Alianza para el progreso e La civilización está haciendo masa y no deja oír (de Ludueña), La família unida esperando la llegada de Hallewyn (de Bejo) e Puntos suspensivos (de Cozarinsky).
Em todos esses filmes visualizamos uma relação constante com o contexto histórico e político de seus respectivos países: a promulgação do Ato Institucional nº 5, no Brasil; a implantação da ditadura do general Juan Carlos Onganía, na Argentina. Nos dois contextos nacionais, encontramos um quadro de perseguição política e censura aos meios de comunicação, que obrigará os dois projetos a seguir o caminho da clandestinidade. Tanto a Belair como a CAM podem ser definidas como produtoras clandestinas, já que não possuíam nenhum documento ou certificado que as identificassem como empresas. Sem CNPJ ou qualquer tipo de registro, as duas empreitadas apostaram todas as suas fichas na produção de filmes, deixando em segundo plano a distribuição e a exibição. Além de serem produções centradas nas possibilidades ilimitadas da expressão autoral e da liberdade de criação, somente alcançadas pela falta de vínculo com as janelas de exibição tradicionais e porque optaram em não se submeter ao crivo da censura, há algo mais que as une. As duas possuem o cinema como principal referência. Aqui, se é possível vislumbrar alguma utopia, ela somente será encontrada pela via da criação e da linguagem cinematográfica. É somente revolucionando o mundo do cinema que se poderá revolucionar o mundo. Tanto os filmes da Belair como os da CAM apresentam um certo repúdio ao conceito tradicional de obra artística: esteticamente bem acabada, de propósitos transcendentes e de inquestionável bom gosto. Mais próximas ao conceito de antiarte, as duas produtoras desejavam efetivar o contato com o espectador pela via da agressão, da falta de transparência do discurso fílmico e do humor corrosivo. Negavam anarquicamente o profissionalismo cinematográfico e recusavam a compreensão da arte e do cinema como mercadoria. Queriam arrancar o cinema de seu aspecto industrial e espetacular, próprio de sua absorção pelo sistema capitalista. Se o capitalismo promovia a espetacularização total das relações sociais, o cinema, aqui percebido como instância superior, deveria, dentro do seu universo, articular exatamente o contrário. A fim de compreendermos determinados tópicos dessas experiências: 1) a relação estabelecida pelos filmes com o contexto político e histórico do momento em que foram realizados, 2) o cinema como referência e 3) a compreensão da cultura e da identidade nacional diversa da defendida pelo cinema político latino-americano, analisaremos um filme de cada produtora, a saber: Sem essa aranha e Puntos suspensivos. |
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Bibliografia | GARCIA, Estevão,“Sem essa aranha” in Contracampo Revista de Cinema nº 58, Rio de Janeiro, janeiro de 2004.
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