ISBN: 978-85-63552-14-3
Título | Corpos e dispositivos em espetáculos intermidiais: imagem e presença |
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Autor | Gabriela Lirio Gurgel Monteiro |
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Resumo Expandido | A complexificação do dispositivo em espetáculos intermidiais deve-se às novas experimentações, na maioria das vezes oriundas de processos de “reapropriação de um dispositivo vindo de outra disciplina artística”(PLUTA, 2011, p.145). O processo de criação do ator diferencia-se quando o dispositivo é usado na sala de ensaio. O dispositivo é processo e não simples recurso para criação; ele não é autônomo e não pode ser analisado isoladamente, não se dissociando do que se cria. Nesse sentido, o corpo do ator é também dispositivo e suas ações surgem na interação com as imagens projetadas. Um corpo-imagem que nasce do encontro entre o virtual e o real, como um amálgama. Interessa refletir sobre o processo de criação das imagens e de como, ao se relacionar com elas, novas imagens são criadas pelos atores. O corpo é tradutor dessa inter-relação, por vezes é atravessado por elas, fragmentado, como nas experiências do Wooster Group e, mesmo, potencializado e expandido, em Brook, Lepage e Bausch. Imagem-paisagem, imagem-referência, imagem-diálogica, muitas são as possibilidades de “padronização” das imagens, como se referiu Zbigniew Bzymek, na busca de uma organização dos modos de criação/percepção das imagens do Wooster Group.
O processo de recepção do espectador também se complexifica na recriação de sentidos provenientes de dois canais de interação com a obra: o que sobrevêm do espaço virtual e do espaço real, ambos acolhidos por um mesmo olhar que reúne e diferencia concomitantemente as experiências sensoriais provenientes de uma dupla percepção. O olhar do espectador é cumulativo e, ao mesmo tempo, funciona como um filtro. Na tentativa de juntar peças de um quebra-cabeças em busca de sentido, age em dois processos complementares - o de refração e o de difração. O fenômeno de refração da luz se dá quando a luz passa de um meio homogêneo e transparente para outro também homogêneo e transparente, porém diferente do primeiro. Nessa mudança de meio, podem ocorrer mudanças na velocidade e na direção de propagação. Na difração, há o desvio ou espalhamento de uma onda a partir de um obstáculo. A interação do corpo do ator, da imagem projetada e do recurso de iluminação cênica podem provocar, em espetáculos intermidiais, os dois fenômenos descritos acima e uma incontável multiplicidade de focos e de percepções a partir desta interação. As imagens chegam fragmentadas, ainda que contenham uma certa linearidade, ligadas ou não a uma narrativa, porque emergem de lugares distintos. O espectador, ao receber, ao mesmo tempo, imagens reais e virtuais divide sua atenção em dois campos de percepção, ora olha para tela, ora para o que ocorre com os atores, no desejo de captar e apreender tudo o que vê. Esta apreensão está intimamente ligada ao impulso em estabelecer conexões, redes de sentidos que o leva à criação imaginária de um terceiro espaço, fusional, em que imagem virtual e imagem real não existem em separado, constroem um terceiro campo de percepção, não mais fraturado. No espaço teatral, guardadas as diferenças de tamanho e disposição espacial, o uso da tela como superfície de projeção de imagens multiplica os pontos de vista do espectador, provocando-o a associar imagens virtuais projetadas às imagens dos corpos dos atores. Nesta dinâmica, tem-se a consciência de um ponto cego, idealmente o ponto em que ambas as imagens se fundiriam em uma terceira, uma imagem-síntese. Este ponto é projetivo, não se situa em um ou outro meio, em uma ou outra superfície; ou seja, ele existe apenas enquanto espaço imaginário. Nesse estudo, dois espetáculos são objeto de análise: “Le Project Andersen”, de Robert Lepage e o novo trabalho de Enrique Diaz, “Cine Monstro”, que acaba de estrear em Curitiba. |
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Bibliografia | BESSON, Jean-Louis; WIBO, Anne (Org). L’acteur entre personnage et performance. Louvain-la-Neuve: Études Théâtrales, 2003.
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