ISBN: 978-85-63552-14-3
Título | Identidade, Foto e Objetos: sobre Retratos da Vó Ana e A Inventariante |
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Autor | PATRICIA FRANCISCO |
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Resumo Expandido | A memória se constitui em situações que ficaram gravadas com um sentido ou significado. Nunca guardamos uma situação inteira, porém um detalhe, algo que ficou marcado por algum motivo de uma experiência vivida. Não há um controle do que podemos recordar no sentido do encontro com esse referencial que possa suscitar a nossa memória. “Um acontecimento vivido é finito, ou pelo menos encerrado na esfera do vivido, ao passo que o acontecimento lembrado é sem limites, porque é apenas uma chave para tudo o que veio antes de depois” (BENJAMIN, W. 1987, p.37).
Em 2008, a artista inicia o projeto de filmes-retratos. Foi um trabalho em processo no qual a idéia central era fazer um filme composto de pequenas unidades. Para isso, eles foram denominados de filmes-retratos. Cada filme-retrato, existia separadamente. Ao juntá-los através de uma montagem ganharam o formato de um filme com o título Retratos da Vó Ana (2008). O trabalho consiste na artista diante da câmera representando os gestos de sua avó Ana. A partir de sua memória, tendo convivido com a avó por apenas 9 anos, o trabalho mostra uma memória ora baseada em lembranças, ora recriada sobre as lembranças. O filme foi editado na somatória de vários flash da memória, representados por pequenos esquetes, como se fossem retratos, onde a artista buscou uma aproximação entre a sua memória e as fotografias da avó. Já em A Inventariante (2010), a artista está diante de uma câmera fotográfica. Em uma animação com 500 fotografias é apresentada a personagem, a inventariante, para designar a escolha de objetos do cotidiano da avó na intenção de fazer um inventário fictício. A ideia central é uma valorização da memória desses objetos pessoais. O filme apresenta duas partes, uma parte dedicada à escolha dos objetos, cada objeto ganha uma importância, sendo mostrado em grande formato no quadro do filme. A segunda parte, mostra a leitura do pedido de inventário no qual vemos várias partes do documento, ao final, temos uma certa ironia poética ao afirmar que esse pedido de inventário está baseado na memória involuntária defendida pelo escritor Marcel Proust em sua obra literária “Em Busca do Tempo Perdido”. A partir desses trabalhos, foi feito um estudo sobre a fotografia e sua inserção nos filmes. Raymond Bellour escreve “entre foto e vídeo, existe o cinema, essa arte um pouco antiga, cada vez mais trabalhada pela foto, que a reconduz como que para aquém de si mesma, já que o vídeo tomou conta dela”.(BELLOUR,R., 1997, p.18). Os trabalhos realizados com imagem digital em vídeo e fotografia remetem diretamente ao texto do autor, uma reiteração de como a imagem fixa, a fotografia, se situa na imagem em movimento, o vídeo ou o cinema. Uma escrita incessante, reunir fotografias e objetos, operando em sequências criadas, não são as sequências verdadeiras ou cronológicas. Essa reordenação vem da busca por construir uma memória baseada em alguns fatos reais que deixaram um rastro, um índice daquilo que aconteceu.“a fotografia’ é o traço (a impressão luminosa, num determinado momento do tempo, de um objeto situado à distância” (DUBOIS, P., 2003, p.247). A fotografia é presença e ausência ao mesmo tempo. E é apenas isso que ela pode nos dar, a fixação e a distância de um passado registrado. Conceitualmente a fotografia é a morte. É o principal mote da fotografia. Então, quando pensamos no gesto fotográfico, na imagem-ato como conceitua Philippe Dubois, poderíamos afirmar que essa ação é o disparador para matar a situação fotografada. A morte e o inventário estão presentes nos filmes trabalhados. Em Retratos, a manipulação das fotografias recorre a construção de uma identidade e, em A Inventariante, a escolha de objetos a inventariar cria um local para a memória só existente no filme. |
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Bibliografia | BELLOUR, Raymond. 1997. Entre-imagens – foto, cinema, video. Campinas: Papirus.
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