ISBN: 978-85-63552-14-3
Título | Cinetismo, Animismo, Animalidade: o devir-animal do cinema |
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Autor | Ivana Bentes |
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Resumo Expandido | Seguindo a proposta da mesa de pensar “o próprio cinema como uma potencia ‘de ordem’ animalesca” propomos apresentar algumas questões ainda iniciais de um vasto campo de problematizações que tem implicações cinematográficas, mas também “antropozoólogicas” e biopoliticas, na constituição da relação homem-animais a partir do cinema e de forma mais ampla no campo das imagens.
A primeira constatação é que os animais, seus corpos e movimentos, são um tema recorrente desde o proto-cinema de Muybridge e Marey. O galope do cavalo em Muybridge, as experiências de síntese e analítica dos movimentos de homens e animais fotografados em estado de laboratório (figuras humanas e de animais em movimento expostas na sua nudez); ou os vestígios, grafismos e rastros “do mecanismo do vôo dos pássaros” como nos estudos de Marey ambos apontando para uma primeira relação entre cinetismo, animismo e animalidade. Em Eletric Animal, Akira Mizuta Lippit pensa a animalidade como uma das centralidades da cultura ocidental e da modernidade e sua problematização do outro. Derrida também já tinha apontado a animalidade como uma das feridas narcísicas: o darwinismo destituindo nossa origem divina, e nos revelando que essencialmente não diferimos do macaco, o animal em nós; ou a psicanálise, com o conceito de inconsciente e o mundo de pulsões e instintos, destituindo a frágil capa de racionalidade com que nos vestimos. Lippit analisa a na noção de animalidade em autores como Nietzsche, Derrida, Freud Lewis Carroll, Kafka, Eisenstein, até chegar a Deleuze e conclui que para o pensamento ocidental os animais não têm linguagem, logo não podem morrer, assumindo assim o lugar espectral de mortos-vivos. Poderíamos dizer que a essa fantasmagoria se superpõe as questões que hoje nos colocamos em relação as máquinas e ao devir maquínico do humano na fabulação de um outro corpo e bios (devir –animal, deriva pós-humana, etc.) Homem-máquina-animal co-evoluindo em figurações híbridas com questões recorrentes: Os animais/máquinas podem se comunicar? Eles têm consciência? Eles estão cientes da morte? Como co-evoluímos com eles? A relação homem-animal-máquina passa pelo “programa em nós”, o quantum de sobredeterminações que nos atravessam no par animal-máquina, o inelutável dos instintos e do programa em nós. Mas também se abre para a fabulação de mundos. ( Donna Haraway. 2009). Mas “o que é ter uma relação animal com o animal?” pergunta Deleuze. Sem vesti-los com características humanas (antropomorfia) ou reduzindo sua diferença. Questão que se desdobra para o que seria essa potência animal desencadeada pelo e no cinema, nas imagens. A questão da animalidade como dispositivo cinematográfico que pode ser pensada a partir da visada da própria câmera como um “animal”: “A relação câmera/animal é a suprema relação fotográfica, e talvez seja a única possível porque a câmera nada mais sabe do que transformar em animal, já que ela própria é um animal. Desse limite devemos fazer um infinito” (Arthur Omar em “ O Animal e a Câmera” citado por Paulo Maia. 2011). No campo da vídeo-arte e do cinema a câmera subjetiva de um animal ou a simulação de “pontos de existência” não-humanos apontam para essa questão. Resta a questão do animismo, para a qual podemos lançar mão da teoria perspectivista de Viveiro de Castro e pensá-la no cinema articulando animismo e maquinismo, Viveiros de Castro coloca de ponta-cabeça a crença evolucionista ocidental de uma animalidade primeira, uma base comum entre homens e animais, que vai se diferenciando pela cultura. Na cosmologia ameríndia, base do seu perpectivismo e multinaturalismo “a condição original comum aos humanos e animais não é a animalidade, mas a humanidade.” Como o cinema, a câmera e os dispositivos de perspectivizações contemporâneas podem restituir essa humanidade/animalidade radical, um animismo maquinico que engendra mundos? E o que transmuta um desejo de morte e dominação entre espécies numa conexão amorosa? |
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Bibliografia | DELEUZE, Gilles. O Abecedário de Gilles Deleuze. A de Animal http://www.oestrangeiro.net/esquizoanalise/67-o-abecedario-de-gilles-deleuze Consultado em 29/03/2013
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