ISBN: 978-85-63552-14-3
Título | Imagem crítica e cinema brasileiro recente: afetos “entre-corpos” |
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Autor | Ramayana Lira de Sousa |
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Resumo Expandido | Jacques Rancière, ao propor uma política da arte, coloca como fundamento uma separação, uma ruptura estética que resulta em dissenso, ou seja, no conflito entre várias sensorialidades. Tal conflito leva à constituição de novos corpos, não mais adaptados à partilha que estabelece os lugares, funções, competências e potências de cada um. Na relação com a obra de arte em geral, e com o filme em particular, os corpos não apenas desafiam essa partilha mas são também expostos a variações, fluxos e mutações. Assim, desse deslocamento dos corpos de seus lugares pré-determinados podemos ver irromper afetos que perturbam noções de realidade e identidade. O que procuramos com essa proposta é, pois, pensar a experiência estética como deslocamento e ruptura, marcada pela emergência de afetos que criam um espaço entre os corpos, aqui vistos (em mirada bergsoniana) como lugar de passagem, como hífen conectando as coisas. É nesse “entre-corpos” que podemos ver surgir, ainda que de forma sutil, sem a fulgurante retórica do espetáculo, o lampejo das imagens críticas.
A imagem,”não é o duplo de uma coisa. É um jogo complexo de relações entre o visível e o invisível, entre o visível e a palavra, entre o dito e o não dito.” (RANCIÈRE, 2010, p. 139), e podemos entender a imagem crítica como aquela que se fundamenta no dissenso, imagem que se assume precária e não explicadora, imagem que exige um abandono, imagem excêntrica. Tais reflexões teórico-metodológicas nos surgem da observação de certo cinema brasileiro recente, especialmente em filmes como O som ao redor (dir. Kléber Mendonça Filho, 2012), A cidade é uma só? (dir. Adirley Queirós, 2011), Trabalhar cansa (dir. Juliana Rojas e Marcos Dutra, 2011) e No meu lugar (dir. Eduardo Valente, 2009). Tais obras se afastam de uma abordagem programática do real e demandam uma abordagem que vá além do desapontamento com a suposta passividade do espectador e do desencantamento da imagem como idolatria. A dialética entre imagem e mundo produzida por esses filmes parece levar a uma recusa da partilha empreendida pelo capital, ou seja, os filmes se recusam mesmo, através de gestos específicos a cada obra, a dar forma ao capitalismo, engendrando vislumbres de mundos em preparação. Ao efetuar essa recusa, o cinema brasileiro de que falo aqui produz um excesso que não pode ser contido e coloca as seguintes questões: “o que fazer com o que já não cabe no seu devido lugar?” e “o que fazer quando já não há lugares devidos?” É essa redistribuição e esse excesso que constituem a política da imagem crítica. Imagem que toma lugar no “entre-corpos”. |
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Bibliografia | DIDI-HUBERMAN, Georges. O que vemos, o que nos olha. São Paulo: Ed. 34, 1998.
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