ISBN: 978-85-63552-14-3
Título | VJing: a produção audiovisual entre o improviso e a partitura |
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Autor | osmar gonçalves dos reis filho |
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Resumo Expandido | Fiéis ao espírito de nosso objeto, começamos sampleando uma imagem-pensamento de Benjamin, pois ainda que não tenha vivido o suficiente para freqüentar uma rave ou participar de uma mixagem ao vivo de imagens, não conhecemos melhores palavras que as do filósofo alemão para descrever essa nova prática que emerge hoje na paisagem audiovisual contemporânea. Nesses ambientes:
"A vida só parecia digna de ser vivida quando se dissolvia a fronteira entre o sono e a vigília, permitindo a passagem em massa de figuras ondulantes, e a linguagem só parecia autêntica quando o som e a imagem, a imagem e o som, se interpenetravam, com exatidão automática, de forma tão feliz que não sobrava a mínima fresta para inserir a pequena moeda a que chamamos sentido. A imagem e a linguagem passam na frente"(Benjamin, 1985,p22). Fusão entre som e imagem, portanto, passagem de figuras ondulantes, suspensão do sentido: eis aí em poucas palavras, reduzida à sua essência, a arte do VJing. Também chamado de live images ou de cinema (ao) vivo, o VJing é o termo mais usado hoje para nos referirmos à prática da manipulação ao vivo de imagens em ambientes imersivos e multisensoriais. Prática que dá continuidade aos movimentos surgidos nos anos 60 que buscam aproximar arte e vida, que desejam tornar a arte processo, valorizando a experiência mais do que a obra, o corpo mais que o discurso, a presença mais que a representação. De fato, o VJing reconfigura decisivamente a questão da presença, do liveness no campo da arte e das imagens em movimento (Auslander, 1999). Herdeiro do Cinema Expandido (Youngblood, 1970), o VJing reconvoca o corpo – em geral entorpecido, posto para dormir nas grandes salas (Greenaway) – e procura repensar as possibilidades do próprio cinema, uma vez que prima pela hibridação entre as artes, por uma prática que associe o cinema a outras linguagens e criações, por um cinema, por assim dizer, para além do cinema, mais integrado à vida. O VJing, portanto, se apresenta como uma prática que opera passagens, que remixa as outras artes, produzindo cruzamentos entre diferentes linguagens, técnicas e saberes. Essas passagens, entretanto, não se dão apenas entre artes e dispositivos, mas sobretudo entre as imagens. Na cultura do remix, há uma imensa mescla e sobreposição de imagens (e sons). Imagens de contextos e idades distintas, vindas da história do cinema, das artes ou da televisão, são reapropriadas, sobrepostas, colocadas uma ao lado da outra, de modo a ganhar novas configurações, novos arranjos que tensionam seus sentidos até o limite. Por isso, pesquisadores como Oliveira vão destacar o jogo arquivístico, o colecionismo e a montagem como características primordiais do VJing. Esses artistas classificam, ordenam e dão (novos) sentidos a antigas formas de sons e imagens. Trata-se de uma nova e reconfigurada categoria de cineastas que “não busca unicamente a narrativa e o drama, mas um registro singular na fronteira da ficção, do documento e o do arquivo” (AUMONT, 2004, p.87). Nesse contexto, nos interessa pensar, sobretudo, o estatuto dessas imagens, pois entre uma passagem e outra há uma mutação pela qual elas perdem parte de sua consistência, se abrindo para outro estatuto como imagem física e mental. Aqui elas adquirem certa plasticidade, uma natureza predominantemente pictórica (Dubois). Parafraseando Parente, diríamos que agora “o que pensa nela e, por ela, é um puro interstício, como sua possibilidade de se metamorfosear (passar entre)”. Nosso intuito, portanto, é investigar as qualidades estéticas desse novo regime de visualidade, colocando-o em diálogo com os escritos de Deleuze sobre a percepção gasosa e com análises de Gil sobre as pequenas percepções. Afinal, que tipo de imagem é essa que se liquefaz, que explode, transborda a tela e, muitas vezes, evapora? Que novas formas de percepção são colocadas em jogo pelos VJs? Que processos de subjetivação se criam na multiplicidade lisérgica e desierarquizada das projeções ao vivo? |
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Bibliografia | AUMONT, Jacques. As teorias dos cineastas. Campinas, SP: Papirus, 2004.
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